Após 1 ano, Justiça reabre apuração de denúncia de tortura contra travesti

A polêmica prisão de Verônica Bolina completa um ano neste domingo (10), com a travesti aguardando ser ouvida pela Justiça, que reabriu a investigação que arquivou as denúncias de tortura, xingamentos e constrangimento supostamente cometidas por policiais contra ela. 

A maquiadora também aguarda ser julgada pelos crimes que cometeu entre os dias 10 e 12 de abril de 2015, quando foi presa, acusada de tentar assassinar uma idosa, agredir uma transexual e uma mulher, brigar com policiais militares e ainda arrancar a orelha de um carcereiro na cadeia do 2º Distrito Policial (DP), no Bom Retiro.

Acreditando ter sido vítima de represálias por parte dos policiais, foi nesta delegacia que Verônica acabou apanhando, onde acabou ofendida e teve fotos seminuas dela, com o rosto inchado e algemada divulgadas na internet. Ela teria sofrido as agressões dos agentes e alguns presos. Já as fotografias e o vazamento delas teriam sido feitos por policiais, que também teria divulgado o perfil do carcereiro sem parte da orelha na web.

De acordo com informações obtidas com representantes do Tribunal de Justiça (TJ),  Ministério Público (MP), defensores públicos e Secretaria da Segurança Pública (SSP), a Corregedoria da Polícia Civil reabriu o caso por determinação judicial.

Desse modo, a Corregedoria voltou a investigar policiais civis por supostos crimes de tortura, injúria e constrangimento ilegal contra a travesti.

Anteriormente, esse mesmo órgão tinha concluído que os agentes apenas usaram a força física necessária para conter e se defender de Verônica. Como ela também brigou com outros presos, a identificação de quem a machucou teria ficado prejudicada.

A Corregedoria ainda havia informado que não foi possível identificar o responsável por tirar fotos dela e espalhá-las na web. Diante disso, decidiu arquivar o caso sem apontar culpados.

O G1 obteve o relatório preliminar dessa apuração e exibe trechos das conclusões nesta reportagem. Parte do documento foi encaminhada neste ano pela SSP à Secretaria Nacional de Segurança Pública (Conasp). No total, 28 pessoas, entre a vítima e policiais, foram ouvidas.

A Corregedoria da Polícia Militar (PM) também chegou a investigar se seus policiais agrediram e fotografaram a travesti, mas, assim como o órgão correspondente na Polícia Civil, arquivou o caso. O arquivamento da PM, no entanto, teria sido aceito pela Justiça.

Reabertura
“A Corregedoria da Polícia Civil informa que está em andamento o inquérito que apura tortura, injúria e constrangimento ilegal, em que policiais são averiguados. A instauração desse inquérito é uma requisição judicial”, confirmou na quarta-feira (6) a assessoria de imprensa da pasta da Segurança Pública por meio de nota.

Ainda segundo a secretaria, a investigação preliminar que analisava se policiais cometeram infrações funcionais havia sido “arquivada porque não identificou indícios de irregularidade.”

Em outra nota da SSP, a Corregedoria da PM também isentou os policiais militares de quaisquer abusos na prisão de Verônica. O caso foi arquivado em agosto do ano passado. “A conclusão foi que não houve excesso na atuação dos policiais para a contenção de um preso bastante agressivo e de compleição forte”.

Tortura
Nas imagens compartilhadas no Facebook e WhatsApp, Verônica aparecia de cabelos curtos, sem peruca, o rosto machucado, roupas rasgadas, descalça e os seios nus. Ela ainda estava algemada nas mãos e nos pés enquanto era vigiada por policiais armados na cadeia do 2º DP.

Para a Defensoria Pública de São Paulo, que está defendendo Verônica na Justiça, há indícios de que a maquiadora foi torturada. A travesti teria sido espancada por policiais em retaliação por ela ter arrancado a dentadas a orelha do carcereiro. O perfil do rosto dele, sem parte da orelha, também circulou nas redes sociais, gerando revolta de seus colegas de profissão.

O caso de Verônica também é acompanhado pelo Departamento de Inquéritos Policiais (Dipo), situado dentro do Fórum Criminal Central, e pelo Grupo de Atuação Especial de Controle Externo da Atividade Policial (GECEP) do MP.

Relatório
O relatório da Corregedoria da Polícia Civil informa que arquivou a apuração contra policiais investigados porque “não foi constatado o abuso” denunciado por Verônica.

Em depoimentos às corregedorias e ao MP, a maquiadora acusou policiais civis, policiais militares e até outros presos de terem batido nela. Também contou ter sido xingada por funcionários de um hospital, onde foi levada para fazer exame de corpo de delito por conta dos machucados que sofreu.

Inicialmente, os agentes negaram as agressões à travesti, dizendo que ela havia apanhado de presos, com os quais se desentendeu enquanto esteve na cela da delegacia.

O relatório da corregedoria informa ainda que, apesar de o Instituto Médico Legal (IML) ter constatado que Verônica sofreu lesões, não foi possível apontar os policiais como os únicos responsáveis pelos machucados na travesti.

Isso porque, segundo o documento, a maquiadora entrou em luta corporal com policiais militares que tentaram prendê-la, depois com presos da cela para onde foi levada, posteriormente com o carcereiro, que tentou se defender das dentadas de Verônica em sua orelha, e ainda teve “embate” com os policiais que tentaram imobilizá-la.

“As lesões resultantes dos laudos do IML foram resultantes da defesa do próprio [carcereiro] que a todo custo tentava desvencilhar-se do ataque de Verônica, e dos outros policiais, que também foram agredidos, quando do embate ocorrido”, informa o relatório preliminar.

“Cumpre salientar que também houve problemas com outros presos no interior da carceragem e que Verônica também teria apanhado dos presos, sendo que portanto o resultado do exame de IML não pode ser imputado aos policiais”, escreveu a policial da corregedoria que relatou a apuração.

Ainda segundo o documento, “Verônica mentiu, quando alegou que um cabo de vassoura foi introduzido em seu ânus pelos policiais”. O resultado do IML deu negativo para esse tipo de lesão.

O relatório ainda informa que “não foi possível descobrir quem teria tirado as fotos que retrataram o dia dos fatos, e que expuseram Verônica, após o ocorrido”. O documento reforça que a maquiadora “já entrou na carceragem sem peruca”.

Diante dessas alegações, a autoridade policial responsável pelo relatório escreveu que “a proposta desta signatária é de arquivamento da presente apuração preliminar”.

Presos
De acordo com o documento da Corregedoria da Polícia Civil, Verônica contou que “entrou em luta” com policiais militares no “pátio da delegacia”, “caindo no chão”, e sendo “algemada novamente com as mãos para trás”. Esse episódio ocorreu no dia 10 de abril do ano passado.

A maquiadora falou ainda que apanhou dos presos após se desentender com eles na cela do distrito policial. “Acabou por levantar a saia até o peito e somente para provocar, mostrou a genitália, e um dos presos, o mais forte, deu uma rasteira e o outro deu várias bicudas nas costas”. Os detidos disseram que Verônica se masturbava, segundo o documento.

Carcereiro
Ainda segundo o relatório da corregedoria, dois dias após sua prisão, Verônica contou que o carcereiro entrou na cela onde ela estava e pediu para os presos saírem. Em seguida, disse para a travesti se levantar. Como ela não obedeceu, ele “então chutou a declarante no chão”, que reagiu e “voou na orelha do homem, e arrancou um pedaço”.

O relatório informa que, após ter tido a orelha arrancada por Verônica, o carcereiro tomou remédios contra doenças sexualmente transmissíveis, como retrovirais. No documento, um delegado afirma que a maquiadora estaria num grupo de risco para doenças contagiosas.

Policiais
Segundo declarou Verônica, mais policiais entraram na carceragem. “Um policial entrou com um ‘rifle’ e deu três tiros apontando para seu rosto, mas que atingiram o chão”. Ela relatou que teve as mãos algemadas na cela e os pés no pátio.

Apesar de ter contado que ficou com algemas, a maquiadora disse à corregedoria que ainda segurava numa das mãos o pedaço da orelha. Os policiais deram outra versão: que Verônica estava com a parte arrancada dentro da boca.

A travesti alegou que os policiais “a violentarem com um cabo de vassoura, socando no ânus” na frente dos presos porque ela não dava aos agentes a orelha que havia arrancado do carcereiro. Segundo documento da corregedoria, no entanto, o laudo do IML deu “negativo, ou seja, não houve a violência reportada” pela travesti.

Verônica ainda contou que após ter ouvido mais um tiro, “colocaram saco na sua cabeça”. A maquiadora disse que “não recorda-se das características dos policiais”.

Enfermeira
Quando foi a um hospital, Verônica disse que “foi xingada por pessoas da equipe médica”. Após soltar a orelha, falou que foi chamada de “traveco desgraçado” por uma enfermeira.

Delegado
De acordo com um delegado do 2º DP ouvido pela corregedoria, Verônica negou na frente de cerca de 30 pessoas, incluindo representantes de grupos LGBTTT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros), que tivesse sido torturada. “A mesma disse que não foi torturada e sim agrediu e foi agredida”, declarou o policial no documento.

A Justiça aceitou a denúncia do Ministério Público contra a travesti para que ela responda presa pela tentativa de homicídio da idosa e por ter batido em algumas pessoas. Mas esse processo que apura as agressões cometidas pela maquiadora encontra-se suspenso, pois foi solicitado pela Promotoria um exame de sanidade mental de Verônica, que ainda não foi realizado.

Em depoimento a promotores do Gecep, a maquiadora confirmou que agrediu a idosa e arrancou a orelha do carcereiro porque a primeira fez magia negra contra ela e o segundo a agrediu. Disse ainda que só aceitou gravar áudios negando ter apanhado dos agentes em troca da promessa de redução de pena. Sua voz também acabou compartilhada nas redes sociais.

Do G1

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