Na análise de cientistas políticos consultados pelo Portal da Band, Temer veio para ficar. “Acredito que esta etapa seja o ápice do processo, apesar de não ser conclusiva, porque é decisiva para a questão com a chegada de um novo governo”, avalia Michel Mohallem, especialista em ciência política e professor de direito na FGV do Rio de Janeiro.
“Nas próximas semanas, haverá uma aceleração por parte deste novo governo e daqueles que querem apoiar esse governo – tanto no Congresso quanto na sociedade – de criar um ambiente favorável para Michel Temer”, acrescenta.
Esse cenário vai dificultar que Dilma volte ao cargo e deve contribuir para que o processo de impeachment seja validado.
Altos índices de rejeição
“O momento agora é de legitimar esse novo governo, o que pode não ser tão simples – já que Temer tem índices altos de rejeição na sociedade. De qualquer forma, o que veremos é uma tentativa de estabelecer um clima de calmaria; claro que haverá movimentos de esquerda fazendo resistência, mas se dará pouca atenção a isso. Vai parecer que está tudo certo”, avalia Jacqueline Quaresemin, socióloga e professora da FESPSP.
Para a socióloga, o país ainda está polarizado e, sendo assim, Temer precisa saber dialogar com esses movimentos de resistência. “Diferente dos grupos pró-impeachment, cuja bandeira única é a luta contra a corrupção, esses movimentos governistas batalham há anos por direitos sociais. Se Temer não responder a isso, ele pode sofrer muita pressão”, observa. Isso não significa, porém, que tais movimentos vencerão Temer, mas a última coisa que o presidente em exercício precisa é de mais uma dor de cabeça, além das muitas que terá de enfrentar logo que assumir a cadeira de Dilma.
Maré de problemas
Michel Temer assume, pelo menos, com dois embaraços resolvidos. Eduardo Cunha (PMDB-RJ) foi afastado da presidência da Câmara, o que dá um ar mais ‘limpo’ para o processo que levará Temer à Presidência; e Delcídio do Amaral (sem partido-MS), que poderia causar um mal-estar caso participasse da votação do impeachment, teve o mandato cassado.
“Isso ajuda o novo governo? Ajuda, mas é importante lembrar que Temer terá três grandes problemas para solucionar; o primeiro é a formação da base do governo, o que já é previsto e é até tranquilo de resolver, mas os outros dois são mais complicados”, afirma Mohallem.
Um dos aborrecimentos do peemedebista é a investigação da Lava Jato. “A operação tem lançado fogo em lideranças do PT e do PMDB, incluindo o próprio Temer. Como presidente, ter que lidar com uma agenda criminal é constrangedor”, complementa.
O terceiro problema trata-se de um enorme desafio que mora no Tribunal Superior Eleitoral, órgão que investiga os recursos supostamente ilícitos da campanha da chapa Dilma-Temer. “A análise de dados da campanha pode revelar algo que complicará muito a vida de Temer. Como presidente do TSE, o ministro Gilmar Mendes vai tentar desvincular Temer da chapa, mas isso será muito improvável, visto que há outros ministros cuja posição não é tão clara. Se surgir algo escandaloso daí durante o afastamento de Dilma, isso pode impactar até na votação final no Senado”, observa Mohallem.
O PT pós-impeachment
Na visão de Mohallem, o Partido dos Trabalhadores, logo após o afastamento de Dilma, passará a se desvincular dela. “O partido começará a olhar para outra direção, para as eleições presidenciais de 2018”, acredita. “Ainda não dá para saber se o PT será competitivo a ponto de ganhar a eleição, mas com certeza terá um peso, já que outros partidos fortes – como o PSDB, não têm grandes nomes definidos para a disputa.”
Segundo Jacqueline Quaresemin, o Partido dos Trabalhadores sai chamuscado do episódio, mas com uma grande chance de ressignificar a sua história política. “O PT, que estava dividido por causa da Dilma, poderá agora se unificar e trabalhar a tese de que foi uma vítima de golpe; e esse discurso é válido, até porque o conceito do golpe não surgiu de dentro do PT, ele nasceu dos movimentos sociais, de intelectuais, artistas, professores universitários e, principalmente, da juventude combativa e independente de partidos políticos que se aglutina em coletivos.”
Quaresemin acredita, aliás, que o processo de impeachment pode dar fôlego a uma nova esquerda da qual o PT estará na composição, mas da qual não será protagonista. “Desde 2013, temos esses coletivos pautando questões importantes da sociedade e que não estão sendo discutidas pelo Estado”, avalia. “Eles vão continuar fazendo barulho e precisarão ser ouvidos pelo governo. Não é mais possível que a sociedade, principalmente as minorias, seja excluída de seus direitos básicos. Não é nem questão de esquerda ou direita. Graças à internet e as redes sociais, as pessoas estão percebendo que merecem mais do que lhes é oferecido”, conclui.