O Estado do Rio de Janeiro teve uma média de 13 estupros por dia entre 1º de janeiro e 30 de abril deste ano. Segundo dados do Instituto de Segurança Pública (ISP), órgão ligado à Secretaria de Estado de Segurança do Rio, foram registrados 1.543 casos de estupro no estado nos primeiros quatro meses de 2016. Ainda não há dados referentes ao mês de maio.
O estupro coletivo praticado contra uma adolescente de 16 anos no Rio de Janeiro reacendeu a discussão sobre este tipo de crime. A jovem foi estuprada no sábado (21) numa comunidade da Zona Oeste da capital.
Em depoimento à polícia, ela disse que foi até a casa de um rapaz com quem se relacionava há três anos. Ela afirma que estava a sós na casa dele. A próxima lembrança que tem é apenas de domingo, quando acordou em uma outra casa, na mesma comunidade, com 33 homens armados com fuzis e pistolas. Ela destacou que estava dopada e nua. A polícia já pediu a prisão de quatro homens.
Segundo o Instituto de Segurança Pública, o local em que houve mais registros de estupros no estado entre janeiro e abril foi a unidade policial de Cabo Frio. Foram 98 casos no total. Já as unidades policiais Praça Mauá, Leblon, Rio das Flores, Porto Real, Silva Jardim e Cordeiro não tiveram nenhum registro.
Apenas em abril deste ano, foram registrados 428 de estupro no estado – o que também inclui casos de atentado violento ao pudor. No mesmo mês de 2015, o número foi ligeiramente menor – 420 casos. O total de registros nos quatro primeiros meses de 2015, porém, foi maior que o do mesmo período deste ano – 1.690 contra 1.543.
Dados nacionais
Segundo os dados mais recentes do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, foram registrados 47.646 estupros no país em 2014. O número representa uma queda em relação ao registrado em 2013 (50.320) – mas, ainda assim, equivale a um caso a cada 11 minutos, em média, no país. Os números incluem também os estupros de vulnerável, crime cometido contra menores de 14 anos.
Em entrevista ao G1 na época da divulgação dos dados, a diretora-executiva do fórum, Samira Bueno, afirmou que não é possível saber se houve realmente uma redução no tipo de crime no país, já que a subnotificação é extremamente elevada no país. “É o crime que apresenta a maior taxa de subnotificação no mundo. Então é difícil avaliar se houve de fato uma redução da incidência”, disse.
O analista criminal e também integrante do Fórum Brasileiro de Segurança Pública Guaracy Mingardi concorda. “Embora não tenha culpa de nada, as vítimas se sentem envergonhadas e não querem se expor. Apesar das campanhas que incentivam as mulheres a prestarem queixas, da criação de delegacia da mulher, muitos casos deixam de ser registrados”, disse.
A socióloga Julita Lemgruber, coordenadora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes, do Rio de Janeiro, também vê a impunidade como um das justificativas para a subnotificação de crimes de estupro. “Em países em que as pessoas confiam mais na polícia e na justiça pode haver números maiores. No Brasil, a taxa de atrito, que é a diferença entre a quantidade de crimes e o número de pessoas que cumprem algum tipo de pena por decisão judicial, é muito pequena.”
Julita também acredita que os crimes cujos casos têm grande repercussão na mídia acabam tendo aumento no número de queixas, o que não significa, necessariamente, que estejam acontecendo mais.
Para Guaracy, seria fundamental a polícia ter setores específicos para investigar este tipo de crime para que não fiquem impunes e incentivem as pessoas a denunciarem. “Nenhuma polícia temknow how de investigar crimes sexuais de autoria desconhecida. É preciso ter um grupo especializado, criar setores para isso porque é uma investigação diferente”, comentou.
Nesta sexta (27), o presidente da República em exercício, Michel Temer, anunciou a criação de um departamento na Polícia Federal para coordenar o combate a crimes contra a mulher. “Vamos criar um departamento na Polícia Federal tal como fiz com a delegacia da mulher na Secretaria de Segurança Pública de São Paulo. Ela vai agrupar informações estaduais e coordenar ações em todo país”, escreveu o presidente no Twitter.
Legislação e violência contra a mulher
A principal legislação brasileira para enfrentar a violência contra a mulher é a Lei Maria da Penha, de 2006. A lei configura violência doméstica contra a mulher qualquer ação que lhe cause sofrimento físico, sexual ou psicológico, além de lesão, dano moral ou patrimonial.
A lei classifica como violência psicológica ações como ameaça, constrangimento, humilhação, perseguição, insulto, limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica.
A violência patrimonial pode ser entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens e dinheiro. Calúnia, difamação e injúria são classificadas como violência moral.
A lei define como violência sexual forçar a mulher a manter uma relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso de força, além de impedi-la de usar métodos contraceptivos, força-la ao matrimônio, gravidez ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação.
Em 2009, a lei que trata dos Crimes contra a Dignidade Sexual, de número 12.015, foi alterada e “atos libidinosos” também passaram a ser considerados estupros. A pena varia de 6 a 10 anos de reclusão. Se a vítima é menor de 18 anos e maior de 14, a reclusão aumenta para de 8 a 12 anos. Se resultar em morte, sobe para 12 a 30 anos.
Central de Atendimento à Mulher
Desde março de 2014, o “Ligue 180” se transformou em disque-denúncia, com capacidade de envio de denúncias para a Seguraça Pública com cópia para o Ministério Público de cada estado. Assim, mulheres vítimas de violência doméstica ou outros crimes podem entrar em contato com a central de atendimento através do número de telefone 180.