O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou na última sexta-feira (18) a suspensão da medida provisória 896 de 2019, editada no mês passado pelo presidente Jair Bolsonaro.
A MP dispensava a publicação de editais de licitação, tomadas de preços, concursos e leilões de órgãos da administração pública em jornais diários de grande circulação.
Com a medida provisória, o governo passou a exigir a publicação somente em diário oficial ou site do órgão.
Agora, em razão da decisão de Gilmar Mendes, a MP fica suspensa até que o Congresso Nacional vote o texto da medida ou até que o Supremo julgue definitivamente a questão.
A ação foi apresentada em 13 de setembro pelo partido Rede Sustentabilidade. Segundo a legenda, a MP visava “desestabilizar uma imprensa livre e impedir a manutenção de critérios basilares de transparência e ampla participação no âmbito das licitações”.
De acordo com o texto da ação, Bolsonaro dirigiu ataques a grupos de comunicação “demonstrando seu descontentamento com a imprensa” e afirmou que não havia relevância e urgência que justificasse a publicação da MP porque o tema já estava em discussão em projetos de lei. E afirmou que a MP viola o direito à informação, à transparência e à ampla concorrência nas licitações.
Para a Rede, houve desvio de finalidade na MP, o que, segundo o partido, configura abuso de poder, por se tratar de um “ato de retaliação” do presidente da República contra a liberdade de imprensa. O pedido era de suspensão imediata da MP e, posteriormente, anulação.
No fim de setembro, o ministro chegou a decidir que levaria a questão diretamente ao plenário do Supremo após receber informações detalhadas da Presidência da República, da Advocacia Geral da União (AGU) e da Procuradoria Geral da República (PGR).
Mas, no começo de outubro, a Associação Nacional de Jornais (ANJ) reiterou o pedido de suspensão da medida provisória.
A entidade argumentou que a desobrigação da publicação dos editais afetou o segmento de veículos de comunicação impressos, com o fechamento de pequenos jornais no interior do país.
Diante das novas informações, Mendes decidiu suspender a validade da medida provisória. Ele entendeu que não houve desvio de finalidade na edição da medida, mas considerou que:
- O texto não preenche o requisito de urgência;
- A falta de detalhamento da norma pode prejudicar o direito à informação, à transparência e à publicidade nas licitações;
- Possível ofensa ao princípio da segurança jurídica;
- Perigo da demora pode gerar danos de difícil reparação ao regime de publicidade dos atos da administração pública.
Na decisão de 22 páginas, Gilmar Mendes considerou que o controle judicial sobre a urgência ou a relevância em medida provisória é realizado “somente em hipóteses excepcionais”. Para o ministro, ficou comprovada a relevância no caso, mas não a urgência.
“No caso em tela, ainda que se reconheça a necessidade de modernização do regime de contratações públicas, a edição da MP não parece ter sido precedida de estudos que diagnosticassem de que maneira e em que extensão a alteração das regras de publicidade poderia contribuir de fato para o combate ao desequilíbrio fiscal dos entes da federação”, escreveu na decisão.
O ministro frisou ainda que há diversos projetos de lei no Congresso sobre o tema e que a não publicação dos editais poderia prejudicar o controle social sobre as informações.
“A falta de publicidade nos procedimentos licitatórios, além de acarretar vícios de nulidade, dá margem a práticas de direcionamento dos certames públicos. É inequívoco que o controle social efetivo sobre a divulgação das condições edilícias depende do funcionamento dos mecanismos de divulgação dos instrumentos convocatórios.”
Na avaliação de Mendes, não se poderia alterar a regra sem detalhar como serão as novas publicações.
“Ao se substituir o regime anterior por um novo, o legislador deve ter cuidado para que as novas regras sejam precisamente definidas, de modo a garantir que as informações públicas cheguem à maior extensão possível de cidadãos. Desse modo, a legislação que regulamenta a publicação dos atos oficiais precisa ser, ao máximo possível, minudente, detalhista e descritiva, até mesmo por buscar adequar a sistemática de publicação ao dinamismo da vida social”, afirmou.
O ministro ainda destacou que os efeitos da MP estão “supostamente, afetando a imprensa, especialmente nos municípios, levando ao fechamento ou diminuição de circulação, afetando a própria liberdade de imprensa, bem tão caro à democracia”.
Balanços financeiros
Além da ação referente aos órgãos públicos, a Rede também protocolou no Supremo outro pedido, para suspender a MP que desobriga empresas de capital aberto de publicar balanços financeiros em jornais impressos. O caso está com o ministro Marco Aurélio, Mello, e ainda não há previsão de julgamento.
A medida provisória estabeleceu que as empresas podem passar a publicar os balanços gratuitamente no site da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e também em sua própria página na internet.
A Rede também argumentou na ação que não havia urgência para tratar do tema por medida provisória e o presidente Jair Bolsonaro publicou a regra como “represália” a setores da imprensa.
Segundo a Rede, lei publicada há quatro meses previa que empresas poderiam deixar de publicar os balanços em jornais a partir de janeiro de 2022. E que por isso não havia urgência para se editar uma MP.
G1