O ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, encaminhou ao Palácio do Planalto um conjunto de medidas, intituladas de “pacote antifacção”, com o intuito de endurecer o combate ao crime organizado. Entre as propostas estão a criação do tipo penal de “organização criminosa qualificada”, que prevê pena de até 15 anos de prisão; apreensão e perdimento antecipado de bens; a restrição à progressão de regime para os chefes do crime; e a previsão legal para infiltrar agentes nas quadrilhas.
O projeto de lei deve passar pelo crivo do ministério da Casa Civil, comandado por Rui Costa, antes de ser enviado ao Congresso Nacional.
Segundo interlocutores do ministro da Justiça, a lei que define o crime de organização criminosa não se enquadra mais à realidade das cerca de 80 facções em atividade no país. Por isso, seria necessário a atualização dessa legislação, com a criação de uma nova figura penal para enquadrar grupos, como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho, além de fornecer mais instrumentos para o enfrentamento a esses grupos. Prevaleceu na pasta a ideia de que não se pode caracterizar esses grupos como máfia nem como organização terrorista.
Os principais pontos do projeto são:
Organização criminosa qualificada
- Criação do tipo penal “organização criminosa qualificada”, que prevê pena de 8 a 15 anos de prisão para grupos que tentem controlar territórios e atividades econômicas, “mediante o uso de violência e ameaça”. Além das facções, essa medida visa atingir as milícias.
- A pena é agravada para até 30 anos, se houver homicídio em favor da “organização criminosa qualificada”. Esse crime também passa a ser considerado hediondo, o que o leva a ser inafiançável e sem possibilidade de indulto ou anistia.
- Endurecimento da pena de organização criminosa simples, de 3 a 8 anos para 5 a 10 anos de prisão. A punição aumenta se houver participação de menor de idade, infiltração no setor público e característica que evidencie a “transnacionalidade” da organização e a sua conexão com outras facções.
Confisco mais célere de bens
- A Justiça poderá decretar a apreensão de bens e valores do investigado no curso do inquérito ou de ação penal, quando houver suspeita de que os objetos são fruto do crime. Isso poderá acontecer antes do trânsito em julgado.
- Perda de instrumentos e do produto do crime que sejam de “proveito direto ou indireto da atividade criminosa”.
Para o sistema prisional
- A medida prevê o monitoramento das conversas e reuniões de presos provisórios e condenados por integrar organização criminosa. Com autorização judicial, a captação audiovisual poderá ser realizada tanto no parlatório como por meio virtual.
- A administração penitenciária ganhará o direito de transferir presos para outros estabelecimentos prisionais, comunicando imediatamente o juiz. Isso só poderá ser feito no caso de risco iminente à segurança, vida ou integridade física de algum detento ou servidor.
Para agentes públicos envolvidos com facções
- A Justiça poderá determinar o afastamento cautelar do servidor público que “promove, constitui, financia ou integra” a organização criminosa.
- O réu condenado por participar de organização criminosa ficará impedido de contratar com o poder público ou receber incentivos fiscais por um período de até 14 anos.
Para empresas envolvidas com facções
- A Justiça poderá determinar “intervenção judicial” na administração de uma empresa envolvida com organização criminosa, com a nomeação de gestor externo.
- A intervenção judicial também prevê o “imediato bloqueio” de qualquer operação financeira, societária ou de gestão de fundos ou ativos financeiros.
- Contratos públicos firmados com essas empresas poderão ser “cautelarmente suspensos” mediante decisão judicial.
Em entrevista ao GLOBO publicada no mês passado, Lewandowski explicou que o objetivo do pacote é “asfixiar financeiramente” o crime organizado. Na ocasião, ele enfatizou que não se trata de um pacote “antimáfia”, apesar de tomar como referência algumas medidas adotadas na Itália para combater estruturas mafiosas, como a Camorra, ‘Ndrangheta e Cosa Nostra. Entre essas medidas está, por exemplo, a possibilidade de congelar ativos do crime organizado antes do trânsito em julgado, quando não cabe mais recursos à Justiça.
Enquanto a PEC da Segurança, enviada ao Congresso em abril, propõe alterações na Constituição que ampliam o papel da União na elaboração de políticas de segurança pública, o pacote “antifacção” será infraconstitucional, com propostas de leis que também serão submetidas ao Legislativo, mas que precisam apenas de maioria simples para aprovação.
O lançamento da medida visa aumentar o protagonismo do governo Lula na discussão de temas relativos à segurança pública. De acordo com a última pesquisa Genial/Quaest, a violência é o tema que mais preocupa 30% da população do país, e vem avançando desde julho desse ano, quando representava a maior preocupação para 24% da população. A segurança pública está na frente de tópicos como problemas sociais (18%), economia (16%), corrupção (14%) e saúde (11%).
Tribuna da Bahia








