pula Lúdico, circense, paixão à primeira vista de dez entre dez crianças, o pula-pula é um pesadelo para ortopedistas e pais: muitos já viram a alegria convertida em gesso, cirurgia e dor para os pequenos. Médicos relatam o aumento do número de casos de acidentes em um brinquedo que sequer é reconhecido como tal pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Sem orientação adequada sobre os perigos embutidos nas camas elásticas, que proliferam por casas de festa e parques públicos, os pais, na maior parte dos casos, só se dão conta do risco diante da realidade:

— Eu não fazia ideia de que o brinquedo era perigoso. Na hora em que vi meu filho naquela situação, entrei em estado de choque total — diz a comerciária Maria do Socorro Moura, de 39 anos.

Um de seus filhos gêmeos, Marlon, de 6 anos, caiu de uma cama elástica em uma praça no Catumbi, na região central do Rio, no último Dia das Crianças, enquanto Maria do Socorro estava no trabalho. Teve uma fratura em um dos ossos da face, no terço médio facial, e enfrentou duas horas de cirurgia no Hospital Municipal Souza Aguiar, onde passou nove dias internado. Foi o caso de trauma mais grave relacionado a pula-pula que o hospital recebeu, e envolveu falha de segurança do equipamento.

Um comunicado feito pela Academia Americana de Pediatria, em setembro do ano passado, aponta os riscos e indica os tipos de fratura e danos que o equipamento, aparentemente inocente, causam com maior frequência — entre eles, as fraturas de punho, antebraço e cotovelo. Um estudo do Nation Wide Children, um dos maiores hospitais americanos, de Columbus, nos Estados Unidos, também do ano passado descobriu que aumentou 15 vezes, em crianças, o número de ferimentos relacionados a esses tipos de brinquedos. Por lá, é moda o uso do brinquedo até mesmo no quintal de casa.

No Brasil, não existem dados oficiais. Mas a Sociedade Brasileira de Ortopedia Pediátrica se baseia nos números dos Estados Unidos.

— Usamos os dados americanos como referência. O percentual de internação de crianças que apresentam esse tipo de fratura, nas camas elásticas, é de 40%. O restante faz o tratamento com gesso. Aqui no Brasil, a questão central é que não existem normas de segurança. Muitas vezes não há supervisão de um adulto — alerta o ortopedista Maurício Rangel, integrante da Sociedade Brasileira de Ortopedia Pediátrica.

Rangel alerta para outro perigo, a mistura de crianças de faixas etárias distintas no equipamento, e para a proliferação do brinquedo:

— Há, por aqui, uma questão cultural, com o aumento do uso do brinquedo em casas de festas e em espaços de recreação. A recomendação é que o pula-pula não seja usado por crianças abaixo de 6 anos, e isso deveria estar especificado no brinquedo.

O presidente do Comitê Brasileiro de Brinquedos da (ABNT), Synésio Batista da Costa, sustenta que o pula-pula não pode ser classificado como um brinquedo, por isso não é enquadrado por qualquer norma.

— Isso é um instrumento de entretenimento, não um brinquedo. Nunca deveria ser utilizado em parques e festas infantis. Ao brincar nele, não há um instrumento de controle. Esse tema não está regulamentado. Ele sempre foi de academia, para fazer jumping. É uma atividade física. É absolutamente inadequado para crianças. Não pertence a nosso ambiente de atuação — diz Synésio, que é também presidente da Associação Brasileira de Fabricantes de Brinquedos (Abrinq).

Ana Cintia de Lima Viana, de 32 anos, lembra o que ouviu da pediatra ao chegar ao Hospital das Clínicas de Jacarepaguá, com a filha, Isabele Cristina, de 6 anos: “Mais um caso com o bendito pula-pula. Já é a quarta criança que atendo hoje”

— Ela disse que é absurda a quantidade de crianças que têm caído de cama elástica. Fiquei assustada, não sabia que era tão perigoso. Ninguém tem essa noção — conta Ana.

No dia 22 de agosto, Ana Cintia estava com a menina e o filho de 3 anos em uma casa de festas, na Taquara. Deixou Isabela no pula-pula, sob a supervisão de uma monitora, para levar o filho ao banheiro. Quando voltou, a menina chorava. Contou que caíra em cima do pé direito. Isabele ficou 15 dias com uma tala na perna, sob o risco de sofrer uma cirurgia. O osso não se consolidou, colocou-se gesso. Isabele quebrou o osso maléolo lateral.

— Ela não se levantava para nada. Até para ir ao banheiro era no colo. Ainda está mancando e talvez precise fazer fisioterapia. O pior é que na creche em que ela e meu filho estudam, também tem pula-pula. Já disse para ela não pular. Mas não tem muito como evitar — resignou-se a mãe.

Pela internet, é possível encontrar farta oferta do equipamento. No Rio, é comum que ele seja incluído pelas casas de festas, de graça, nos pacotes para aniversários infantis. Mães e pais se divertem com a alegria infantil, alheios ao risco, que deveria, na avaliação dos especialistas, estar especificado em avisos à frente do equipamento.

— Eu não resisto quando ela pede. Mas fico sempre observando. Com o cuidado do adulto, acho que é possível evitar acidentes — acredita a comerciante Ruth Salgado da Cunha, de 31 anos, observando a filha, Gisele, de 2, saltar no pula-pula do Parque dos Patins, na Lagoa.

A falta de certificação pelo Inmetro, de fiscalização ou de regulamentação angustia quem trabalha para controlar o volume de acidentes envolvendo crianças. Os números gerais no Brasil mostram que lesões não intencionais, em casa ou nas ruas, levam 125 mil crianças de 1 a 14 anos a serem hospitalizadas anualmente, segundo dados do Ministério da Saúde. O trabalho da ONG Criança Segura é em direção à prevenção: pelo menos 90% das lesões poderiam ser evitadas.

— Quem aluga diz que tem certificação. Mas desconheço qualquer certificação para cama elástica. Temos que acabar com essa cultura de que o acidente acontece, de que foi uma fatalidade. Existe um culpado, que não é a mãe da criança. Se tem um produto no meio, a gente é leiga. Não pode ser responsabilizada por uma produto que veio de uma indústria. Que sejam seguros e não exponham as crianças a risco — diz a presidente da ONG, Alessandra Francoia, ressaltando a febre que virou o pula-pula. — Em tudo quanto é festa de criança tem. E mesmo em qualquer comunidade de baixa renda vai ter. Dependendo da condição social, a sequela na criança é ainda maior.

As fraturas do cotovelo e do rádio são as mais comuns, atesta o médico Almir Antunes, chefe de Ortopedia do Souza Aguiar, que, como a maioria de seus pares, não vê o pula-pula com bons olhos:

— Eu acho o brinquedo perigoso. Não tem como controlar criança pequena. E misturar criança menor com maior aumenta ainda mais o risco, porque a base fica mais instável. Para mim, o ideal seria reduzir a idade mínima para 10 anos. E a questão é que agora o brinquedo está mais presente do que nunca nas festas infantis.

Há dois anos, Beatriz Neves, de 8 anos, rompeu o tendão da perna direita. Fruto de uma colisão com um primo, seis anos mais velho, em um pula-pula na Praça Afonso Pena, na Tijuca, Zona Norte do Rio. Na hora, a mãe, a servidora pública Milena Rodrigues da Silva, percebeu o inchaço e levou a filha a um hospital particular.

— Foi no primeiro dia de férias. Na época, o ortopedista falou que é muito comum o acidente. E é inevitável. Aonde você vai, tem o brinquedo. Não tem como segurar. A oferta é muito grande — diz Milena.

No caso do Rio, a prefeitura informou que cabe a cada subprefeitura fiscalizar sua região.

Para tentar debelar os riscos, a recomendação da ONG Criança Segura é que os pais ou responsáveis observem se, na parte das molas, o equipamento é coberto por um tecido. E que crianças menores não brinquem com as mais velhas:

— A questão das molas tem causado muito lesão grave, caso de amputação, fratura exposta. O depoimento dos médicos é que todo fim de semana chega criança com problema. É o brinquedo da vez. É o que mais tem causado lesões às crianças — diz Alessandra Francoia.

O globo

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“Hoje, no aniversário da minha filha, a PF fez busca e apreensão novamente na minha casa por determinação de Flávio Dino [ministro do STF]. Perseguição implacável!”, escreveu.

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Aprovada na sessão plenária do dia 9 de dezembro, a Resolução 085/2025 entrou em vigor a partir da última sexta-feira (12.12), quando foi publicada no Diário Oficial Eletrônico do TCE/BA, e tem como objetivos fundamentais assegurar a transparência e a rastreabilidade na execução orçamentária e financeira, além da…

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Com a aprovação do texto, a idade máxima passa a ser de 35 anos para o quadro de oficiais e praças, e de 40 anos para o quadro de oficiais médicos, de saúde ou outras especializações eventualmente existentes em âmbito estadual ou distrital.

“Estamos diante de um projeto que vai mudar a vida dos concurseiros policiais e bombeiros. O que estamos fazendo é garantir que, uma vez que ele passe, mesmo que o estado demore a abrir a vaga, ele não perde o concurso que se dedicou a fazer”, afirmou o senador Jorge Seif.

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A articulação do Legislativo ocorre em torno do Projeto de Lei (PL) nº 1.388/2023, de autoria do ex-presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e elaborado por uma comissão de juristas presidida por Ricardo Lewandowski, ex-ministro do STF e atual titular da Justiça. A relatoria da matéria está com o senador Weverton Rocha (PDT-MA) e a expectativa é de que o parecer do…

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O texto segue agora para sanção presidencial. Com a aprovação, a expectativa é que o Congresso vote na próxima semana a Lei Orçamentária Anual (LOA) para o ano que vem.

Entre outros pontos, a LDO prevê um superávit de R$ 34,3 bilhões em 2026, o equivalente a 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB). O texto estabelece ainda que o governo poderá considerar o limite inferior da meta para fazer limitações de gastos.

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