Por Alinne Torres
Pessoas nas janelas e nas ruas molhando umas as outras com água perfumada ou suja em um verdadeiro Carnaval. Assim pode-se definir os primórdios do Carnaval da cidade de Juazeiro. O início da festa é marcado pela tradição do “Entrudo”, que eram brincadeiras típicas das festas carnavalescas europeias. Com o passar dos anos, outra brincadeira ganhou o gosto dos moradores da cidade. Era a chamada “Laranjinha”. Continuou-se jogando água perfumada nas pessoas, mas dessa vez através de uma laranja feita de parafina.
A partir dessas evidências relatadas ao Jornal Diário da Região pela professora e historiadora Maria Isabel Figueiredo, conhecida na comunidade como Bebela, revela-se que antes de 1914, data oficial do registro da festa, os moradores já participavam de festas de carnaval na cidade.
Ainda de acordo com Bebela, há registros de que a folia momesca já acontecia desde o século XIX. Em 1897 a família Pereira Melo fundou a Sociedade Filarmônica 28 de Setembro. A partir dessa data bailes carnavalescos eram realizados entre os membros da família.
Em 1901 foi criada a Sociedade Filarmônica Apolo Juazeirense. Em meados de 1914, as duas filarmônicas tornaram-se rivais e fundaram, cada qual, o seu clube carnavalesco que eram: “Filhos do Sol,” da Sociedade Apolo, e “Os Embaixadores de Veneza”, da Sociedade 28. Os clubes desfilavam em carros alegóricos puxados a cavalos e costumavam disputar hinos.
Nesse momento o carnaval de Juazeiro ganhava novas conotações e formas de diversão variadas. Após o clico do “Entrudo” e da “Laranjinha”, o lança-perfume tornou-se moda entre os foliões. “As pessoas dançavam carnaval jogando lança-perfume umas nas outras. Tinham as fantasias de jardineira, japonesa, chinesa, colombinas, baianas, príncipes, entre outras. Era muito bonito o carnaval, não era essa massificação”, afirma Bebela. O lança-perfume era usado para perfumar as fantasias e também como início de namoro.
No final da década de 1940 a festa começou a contar com a exuberância das Escolas de Samba, as famosas batucadas. “A Cacumbú foi a mais famosa. Ela tinha uma percussão extraordinária. Depois surgiu a Nego Beba Aí, Piratas Reis do Samba, Voz do São Francisco, entre muitas batucadas. Cada uma tinha uma percussão diferente e um samba enredo”, relembra a historiadora.
Nas décadas de 1950 e 1960 muitos visitantes já tinham como destino, para o período de carnaval, o município de Juazeiro. Nos bailes se divertiam e se fantasiam. É importante frisar que a festa acontecia tradicionalmente no feriado nacional de carnaval. Foi nessa época que surgiu o “Corso”, um bloco que levava para as ruas o desfile de diversos carros enfeitados.
Para Bebela, a década de 1960 é considerada como os “anos dourados” do carnaval de Juazeiro. “Era um momento de muita alegria. Tinha o “Corso” e também os blocos que saiam de manhã com fantasias de mortalha e depois de macacão. A tarde acontecia o carnaval da Rua da Apolo, hoje Rua Goes Calmom, com batucadas. Os alto-falantes entoavam as chamadas das Escolas de Samba. Era uma coisa incrível aquela Rua da Polo. A noite tinha as batalhas de confetes e de serpentinas. A disputa era grande para saber quem jogava mais se era a Sociedade Apolo ou a 28. Tinha também os blocos das pessoas trajando fantasias de baianas, ciganas, e etc. As orquestram participavam dos desfiles desses blocos que sempre passavam pela Rua da Polo e entravam na Rua da 28”, conta.
Nessa mesma década os carros alegóricos ganharam mais destaques nas avenidas. “Alaô Melo e sua esposa Fernanda, Joca Oliveira, Orlando Pontes, Fernando Oliveira faziam os carros alegóricos com mais de seis ou oito metros. Era toda uma estrutura montada a partir de temáticas como o Rio São Francisco, Baianas, Jardim de Versalhes, entre outros temas”, explica a professora.
Um dos destaques do Carnaval de Juazeiro, segundo a historiadora, foi o Bloco Zero. O bloco acolhia as pessoas que não estavam incluídas nos clubes da Sociedade Apolo, 28 e Artífices. O Zero se destacava por ser contra as diferenças de classe. “Dona Jerusa Rosa, Adalto Moraes, Zé Custodio, Vadú, foram alguns dos fundadores do Zero. Eles alugavam qualquer casarão e faziam o baile. Era lindo”, frisa Bebela.
Outra diferença marcante do Bloco Zero é que os componentes só pulavam carnaval ao som de compositores juazeirenses, deixando um pouco de lado as canções carnavalescas típicas do Rio de Janeiro. “Nessa época a gente ouvia mais as rádios do Rio de Janeiro do que as de Salvador. As estações do Rio eram mais potentes. Mas no Zero só se cantavam músicas de compositores juazeirenses. Além da brincadeira do carnaval havia a cultura musical”, salienta Bebela.
Um dos ciclos do Carnaval de Juazeiro, como Bebela costuma se referenciar, faz menção ao surgimento dos Reis Momos e das Rainhas, sendo um dos primeiros reis momos de Juazeiro o senhor apelidado de “Seu Galo”. Após a sua morte, Eurípedes Lima, que era um compositor juazeirense, assumiu o posto ocupando-o por anos.
No início dos anos 1990 o carnaval de Juazeiro ganhou adereços de grande festa. Atrações do Axé Music passaram a se apresentarem no circuito. Os trios elétricos, apesar de que há registros de apresentações em 1955, deram uma conotação maior ao festejo e o abadá passou a ser a fantasia de muitos foliões.
O carnaval de Juazeiro, considerado como o maior Pré-Carnaval do Brasil, está comemorando seu Centenário e uma grande festa pretende animar foliões de diversas faixas etárias a partir de hoje (07) até o dia 16. Aliando a modernidade dos trios elétricos e suas atrações de renome regional e nacional, a festa irá relembrar toda essa história contada pela historiadora Bebela, através dos Desfiles das Escolas de Samba e da escolha do Rei e da Rainha do Carnaval.
Confetes, serpentinas e as recordações de outrora, como a da Laranjinha e das fantasias dos blocos e clubes carnavalescos, encherão de alegria muitos corações juazeirenses, como o de Bebela, que ao final da entrevista deixou escapar uma das marchinhas que fizeram sucesso no Carnaval de Juazeiro e que referenciava o Bloco Zero.
“Zero, zero, zero, zero, brincar eu quero, brincar eu quero.
Zero, Zero, Zero, Zero, é o melhor do carnaval”.
[youtube]https://www.youtube.com/watch?v=HDobJDpdLy8#t=0[/youtube]