As últimas semanas marcaram o retorno a cena de jovens voltados a barrar o aumento das passagens na capital paulista. Além da truculência policial como impulsionador de novas mobilizações (o que demonstra apego a valores democráticos), em parte, a multiplicação de protestos buscam articular demandas que de longe se limitam a questões de mobilidade urbana. O repertório político consiste, grosso modo, em duas dimensões: uma geral e outra particular.
Apesar de vivermos uma democracia que possui feição institucional participativa somada a um sistema político representativo consolidado, ambos com performance bastante razoável, conforme o mainstream da ciência política, há o sentimento na sociedade civil de “deformação” da política brasileira. Corrupção, fragilidades no acesso à justiça, desigualdades, descaso com direitos (educação, segurança, saúde, etc.), são algumas das bandeiras bradadas nos protestos realizados. Este arsenal crítico de dimensão geral atinge a crença no sistema político que temos, mobilizando um sentimento de mudança.
A dimensão particular dos protestos articula-se com as agendas locais que melhor buscam se aproximar da capacidade de mobilização em pauta pelos atores políticos contextualizados. Ou seja, é possível que as mobilizações apresentem pautas distintas que prezem pela maior adesão.
O balanço entre estas duas dimensões nega a “apatia” da sociedade civil brasileira, ao mesmo tempo em que explicita novos atores que ultrapassam em parte as organizações rígidas de associação, dando fluidez a sujeitos que não precisam tanto de intermediários (sindicatos, movimentos sociais, etc.), embora os partidos políticos tenham importância na capacidade de organizar e “seduzir” ideologicamente, uma vez que a heterogeneidade do movimento abre espaço para discursos mais elaborados, ou seja, um projeto político viável de negação do status quo. Decerto, estes protestos adicionam novos elementos de análise a conjuntura política atual, mas dialogando com os desafios de compreender as raízes do Brasil do século XXI.
por Cláudio André de Souza, * Cláudio André de Souza é professor de Ciência Política da Universidade Católica do Salvador (Ucsal).