“Se vocês querem melhorar o nível de chuvas da sua região, têm que começar a plantar árvores já”. Esta foi a recomendação do engenheiro químico e consultor em saneamento e meio ambiente Celso Luís Giampá, durante a Mesa Redonda Água e Meio Ambiente, do Encontro Preparatório para o Fórum Mundial da Água. Autor do livro Água: a próxima guerra, ele foi categórico ao dizer que para assegurar o abastecimento de água é preciso ter atitudes mais sustentáveis.
Isso tem a ver com o ciclo hidrológico, que é afetado com o corte de árvores. Um dos fatores que provocam chuvas são os chamados “rios voadores”, enormes massas de vapor d’água vindos na atmosfera que em condições propícias precipitam. O problema é que estes rios não são somente alimentados por água que vem dos oceanos, rios e lagoas, mas também por umidade resultante da evapotranspiração das plantas.
Ressaltando que o Brasil é um país privilegiado pela grande quantidade de água doce disponível e pelo fato de a maioria dos seus rios estarem localizados inteiramente dentro do território nacional, ele enfatizou também a necessidade de políticas de uso racional da água serem efetivadas e se tornarem prática constante dentro do país. “A água não nasce da torneira. Infelizmente, o povo só percebe que temos um problema de água quando abre a torneira e não sai água. É só aí que as pessoas vão começar a se manifestar”, apontou.
Florestas
Trazendo uma visão mais ampla sobre o ciclo hidrológico, o meteorologista Augusto Pereira Filho explicou que as secas têm relação com a redução de injeção de vapor d’água neste processo e o desmatamento tem contribuição nisso.
“O ciclo da água nos solos é afetado pela evapotranspiração. Na região que tem floresta tem menos umidade do solo porque as árvores puxam esta água e devolvem à atmosfera por evapotranspiração. Onde não tem floresta a água fica lá parada, sem uso, ela pode causar erosão e voçorocas e assim por diante”, ressaltou Pereira Filho.
Fazendo um convite aos espectadores a repensar o seu modo de consumo e forma de tratar a natureza, o especialista em desenvolvimento Nelton Friedrich trouxe uma visão holística sobre as causas da degradação dos recursos hídricos.
Dedicado atualmente a implantação de políticas e ações que visem à implantação da agenda 2030 da ONU (composta por 17 objetivos de desenvolvimento sustentável propostos pela ONU), ele apontou a necessidade urgente de mudança no nosso pensamento como sociedade, aliando economia e natureza.
“Nós estamos falando de processos produtivos na marca do pênalti porque nosso padrão de consumo se tornou insustentável. O processo de desertificação está acontecendo por causa do conceito de produção existente, de que a natureza é um bolsão de que eu posso tirar tudo o que posso”, provocou.
Para Friedrich, além da implantação de uma política nacional de uso e reuso de água falta um grande pacto nacional em torno da questão do uso sustentável de recursos hídricos. Ele ainda parabenizou o sistema formado pelos Conselhos Federal e Regionais da Engenharia e da Agronomia pela realização dos encontros preparatórios.
“Aplausos ao Confea/Crea pelo que estão fazendo porque poderiam estar fazendo ações corporativas, mas estão pensando na casa comum, montando propostas para o Fórum Mundial da Água e compreendendo o papel do conselho cidadão”, sinalizou.
Água e cidades foi o tema da segunda mesa-redonda. Compartilharam informações sobre a temática a urbanista, professora Drª da Universidade Federal da Bahia, Glória Cecília Figueiredo e o engenheiro sanitarista e professor da Universidade Federal do Espírito Santo, Ricardo Franci Gonçalves.
A professora abordou a relação entre águas e políticas urbanas na produção da cidade contemporânea. Para Cecília, a postura crítica dos profissionais da área tecnológica é fundamental para impedir que projetos com a visão de “captura privativa da cidade” avancem, como os condomínios de luxo de Salvador que estão impactando na Mata Atlântica e comprometendo os recursos hídricos. “A produção da cidade contemporânea requer leitura crítica e engajamento de toda a sociedade para a construção de soluções que impactem menos no meio ambiente”.
Ricardo Franci defendeu em sua apresentação a criação do arcabouço legal para o reuso urbano da água. “Já que não avançamos nos sistemas de saneamento no Brasil, podemos transformar o limão em limonada e aproveitar a inovação tecnológica para investir em construções flex, ou seja, com sistema hidrossanitário apto para água potável e não-potável. É inadmissível que se construam empreendimentos com vida útil de 50 anos no tecido urbano, usando sistema de água limpa”, finalizou.




