Luana Michels
Filha de uma juíza e de um procurador de Justiça, a advogada Luana Michels encontrou o caminho certo na vida e na profissão apenas depois de conhecer sua maior paixão: a luta pelos “direitos dos pets”
Aos 29 anos, minha vida se resumia a estudar oito horas por dia, frequentar academia e sair à noite. Eu já era formada em direito, mas advogava pouco, só para ganhar alguma experiência. Queria muito ser alguém, não no sentido de ser famosa, mas ser uma pessoa que eu admirasse. Procurei ajudar obras sociais, mas esbarrei na burocracia, e ficava cada vez mais frustrada, me sentindo muito egoísta. Nessa época, minha família deixou a grande casa onde morávamos e fomos para um apartamento. Os cães, que eram da minha mãe, foram doados. Meu sonho era dormir agarrada com nossa vira-latinha, mas minha mãe não deixava! Foi então que quis ter um cachorro só meu. Eu não sabia que existiam animais para adoção. Nem que existiam animais carentes e muitos maltratados. Morei no interior e lá os animais de estimação andam pela rua. Quando via um cão de rua, pensava que ele tinha dono e estava só passeando. Um criador de fox paulistinhas mandou fotos da ninhada de oito. A Tetê era a única cinzenta, e encarava a lente com carinha de coitada. Eu me apaixonei por ela. De tão pequena, parecia um ratinho.
Ela transformou nossa casa. A família passou a conversar mais, o que era raro antes. Tetê virou assunto constante. E, a partir daí, aconteceram várias mudanças gigantescas. Terminei um relacionamento porque meu namorado não conseguia entender que é possível amar a família, o namorado e os animais 100%. A Tetê também mudou meu olhar sobre os animais de rua. Resgatei e doei dois cães de rua, depois participei da ajuda ao Canil Municipal de São Leopoldo, perto de Porto Alegre, onde centenas de animais tinham sido abandonados. As barbaridades que presenciei lá me marcaram para sempre. Tudo isso me fez amadurecer como pessoa, política e profissionalmente. Passei a defender gratuitamente casos de animais de pessoas em situação de vulnerabilidade, como os idosos que têm neles sua única companhia. Meu primeiro caso foi de uma senhora com problemas de saúde, proibida pela síndica de sair com seu cão, a não ser que o carregasse no colo. E o cão tinha mais de 10 quilos! É claro que ela não conseguia. Recebeu sucessivas multas condominiais e já estava quase perdendo seu apartamento para quitar a dívida. Nós conseguimos reverter a situação, provando a inconstitucionalidade das multas e da proibição. Tive muitos casos como esse depois, e sempre ganhamos. Iniciei um grupo voluntário, os Defensores sem Fronteiras*, que por meio do Facebook já doou mais de mil animais em condição de risco. Também denunciamos criadores que mantêm animais submetidos a maus-tratos.
Por causa dos bichos e das pessoas que os amam, aprendi a trabalhar, a ser uma boa advogada – nunca perdi uma causa sequer envolvendo animais – e conheci a solidariedade e o amor incondicional a todos os seres vivos. E aquela Luana que poucos anos atrás tinha baixa autoestima, que não conseguia se encaixar no mundo, hoje se encaixou de forma perfeita. Quando alguém me agradece por ajudar os animais e as pessoas que lutam por eles, respondo: `Eu é que tenho tudo a agradecer`.”