A menos de três meses da maior competição esportiva do mundo, correspondentes estrangeiros que vivem no Brasil apontam a segurança como o maior desafio do Rio de Janeiro durante os Jogos Olímpicos de 2016.
Turistas chineses teriam desistido de vir prestigiar as competições por medo de assaltos, afirmou a jornalista Yang Tanli. Já a comunidade internacional teme ataques terroristas, não os rotineiros pequenos crimes da cidade, disse o americano Brad Brooks.
A Polícia Federal e a Secretaria de Estado de Segurança do Rio de Janeiro não quiseram comentar as opiniões dos correspondentes.
O G1 conversou com jornalistas de cinco nacionalidades. Todos citaram a qualidade da água, sobretudo na Baía de Guanabara, como sendo outro grande desafio para a imagem da cidade.
A maioria, no entanto, elogiou a conclusão da maior parte das obras olímpicas dentro do prazo e destacou o legado na mobilidade urbana garantido pelos Jogos 2016.
Confira abaixo quais as expectativas, as críticas e os elogios dos correspondentes estrangeiros sobre as Olimpíadas do Rio:
Agência Reuters
Brad Brooks
O que espera dos Jogos de 2016?
Acho que os Jogos em si vão ser lindos, uma celebração de esporte, como toda Olimpíada. Infelizmente, também acho que esses Jogos vão ficar um pouco ofuscados pelas crises política e econômica do Brasil. Não tenho nenhuma dúvida de que o Rio vai mostrar seu lado lindo para o mundo, como durante a Copa em 2014. Mas fica uma pergunta – a qual custo? Quais benefícios os Jogos trarão? Certamente o carioca “normal” não vai se beneficiar, com a exceção das melhorias na infraestrutura do transporte.
Desafios
Segurança é um grade desafio – não aquele crime “pequeno” de furto e assalto na rua, estou falando da segurança contra ataques como os que a gente já viu na Europa e nos Estados Unidos. A comunidade internacional certamente não quer ver qualquer ataque feio assim durante os Jogos, então espero que o governo brasileiro esteja trabalhando bem junto com outros países na troca de inteligência, no desenvolvimento de planos para proteger a cidade contra qualquer ameaça de maior escala.
Pontos altos e baixos
O ponto alto é que o Rio já tem um longo histórico de receber visitantes para grandes eventos de forma maravilhosa. Todo mundo sabe que os estrangeiros que vierem ao Rio para os Jogos serão abraçados pelo povo da cidade e vão se divertir bastante.
O baixo é sem dúvida que não vai ter o legado no meio ambiente que foi prometido. Rio 2016 prometeu limpar as águas do Rio, o que não aconteceu nem um pouco. E agora vimos que até a Polícia Federal está fazendo uma investigação na Cedae sobre a poluição na baía e em outros corpos hídricos. Ou seja, pode ser que alguns eventos olímpicos aconteçam em águas que são cenas de crimes ambientais.
Televisão Central da China (CCTV)
Yang Tanli
O que espera dos Jogos de 2016?
A Rio 2016 vai ser a primeira Olimpíada na América do Sul. Acho que a região tem sua própria caraterística, clima tropical, povo alegre, amistoso e braços abertos para o mundo. Sei que hoje em dia não é nada fácil para o Brasil sediar esse evento em meio das crises econômica e política. Mas fico muito impressionada que mesmo com tantos problemas, o Rio ainda possa manter o trabalho na preparação com fé e paixão. Festas que todo mundo espera.
Desafios
Acho que o maior desafio do Rio é o problema de segurança. Muitos turistas chineses encontraram roubos no Rio e isso deixou para eles uma imagem muito ruim da cidade. Porque para um turista, ele só tem poucos dias para sentir a cidade. Se acontecerem roubos, derrubam todas memórias boas. Muitos desistiram de vir pela segurança.
Pontos altos e baixos
O ponto alto é que as infra-estruturas não são luxos, mas são práticas e environment friendly (meio ambiente amigável). Sabemos que durante Copa do Mundo, os super gastos para os estádios deixaram muitas críticas. Mas no caso das Olimpiadas, podemos ver uma mudança. Investiram mais no legado para a cidade. As arenas temporárias que podem ser remontadas para escolas, o metrô, supervia, BRT.
O ponto baixo é a segurança. As revistas nos aeroportos e transportes públicos não são muito rigorosas. Para as Olimpíadas, é preciso levantar mais o alarme. Sabemos que 85 mil agentes de seguranca vão trabalhar em vários aspetos, isso é uma boa notícia
TV Pública da Alemanha
Juan Pablo Mondini
O que espera dos Jogos de 2016?
Acho que os Jogos vão ser um grande marco para a cidade e um grande destaque para o país no exterior, ainda maior do que foi a Copa do Mundo. Talvez por causa da crise política, sinto que muitas pessoas não têm dimensão de quão próximo está o evento e de quanto a cidade foi mudando e se preparando para os jogos.
Desafios
Eu acho que o maior desafio é garantir a segurança para os atletas e para todos os que vão acompanhar os jogos. Por ficarmos tão longe da Europa e do Oriente, muitas vezes esquecemos ou tentamos não pensar no momento altamente arriscado que está vivendo o mundo.
Pontos altos e baixos
Os pontos altos são inúmeros, o maior é a transformação da cidade como não se via desde os tempos em que fora a capital do país. A conectividade que fica depois dos jogos, pelo investimento em infraestrutura de mobilidade urbana é incrível. Acho que muitas pessoas ainda não perceberam isso. Todas as obras de Deodoro que ficam como legado são de grande qualidade.
O Brasil ainda precisa melhorar em planejamento, muitas vezes as obras atrasam e as datas não são respeitadas. Outro ponto baixo, que não é só da organização dos jogos, mas da cultura latino-americana, é que muitas vezes as parcerias público-privadas não respeitam a transparência no manejo das verbas.
El País
María Martín
O que espera dos Jogos de 2016?
Eu espero realmente que seja uma festa em paz, que o Brasil brilhe durante essas duas semanas, na organização e no desempenho esportivo, e que o evento deixe uma bonita memória e um verdadeiro legado na cidade. Agora, acho que o momento atual torna um enorme desafio que esse meu desejo se realize.
Desafios
Tenho curiosidade por saber como a cidade, como um todo, vai responder. O carioca está acostumado com grandes eventos, como o Carnaval, e convive com a cidade parada por mais de uma semana sem reclamar, ao contrário: eles vão fantasiados até no escritório. Mas a Olimpíada monopolizará a cidade por mais de duas semanas e, a diferença do Carnaval, não será um evento de todos e para todos. Haverá dificuldades no trânsito, no transporte público e algumas rotinas serão alteradas: vamos ver como o cidadão responde e se acolhe a festa como sua.
Acredito também que não podemos menosprezar a possibilidade de grandes protestos durante o evento, alimentados pela crise política e alavancados pelas dificuldades financeiras do Estado do Rio, que mantém em pé de guerra seus funcionários e estudantes. Se já na chegada da tocha a Brasília, com meio mundo de olho, os guardas municipais jogaram spray de pimenta num grupo de manifestantes, entendo que o desafio, aqui no Rio, será, como sempre, como esses protestos serão contidos.
Pontos altos e baixos
Acredito que entre os pontos altos está o legado de transporte que a cidade vai herdar, insuficiente para resolver os problemas de mobilidade dos cariocas, mas importante e necessário por oferecer à cidade alternativas de locomoção. A candidatura do Rio surpreendeu positivamente também ao ter concluídas quase todas suas instalações olímpicas a três meses dos Jogos, mas há um porém: depois do desabamento da ciclovia, a rapidez e eficiência perderam importância e geraram desconfiança diante de possíveis falhas de segurança.
Entre os pontos baixos eu destacaria o descaso nas questões ambientais, prometidas na candidatura olímpica e descaradamente ignoradas sete anos depois. A poluição na Baia de Guanabara e o esgoto in natura contaminando o complexo de Lagoas da Barra que rodeia o Parque Olímpico, escancararam promessas descumpridas e desrespeito com a natureza, mas também a oportunidade perdida de avançar em políticas de habitação e saneamento básico na cidade em um momento em que choveram investimentos.
Associated Press
Jenny Barchfield
O que espera dos Jogos de 2016?
Eu tenho seguido todo processo de preparativos dos Jogos desde que eu cheguei no Brasil, em 2012. A gente pensava que o grande problema fosse aprontar as coisas, que tudo estivesse pronto na hora certa. Agora, obviamente, é tudo muito diferente. São fatores maiores, como impeachment, zika, economia. Essas coisas têm tirado os holofotes dos jogos em si.
Desafios
Eu tenho focado muito nesses 4 anos no tema da água, eu interajo todos os dias com essa latrina a céu aberto que é a Baía de Guanabara. Para mim, esse assunto é crucial. As autoridades simplesmente fizeram promessas importantes, mas não chegaram nem perto de chegar a cumprir. É uma vergonha e mais uma vez quem paga o pato acaba sendo o carioca. Fizemos pesquisas de qualidade da água e sabemos até que ponto ela é toxica para nossa saúde. Me preocupo com os atletas e também com os cariocas e fluminenses que vão continuar em contato com essa água podre.
Pontos altos e baixos
A Baía de Guanabara é um ponto baixo, a gente também tem acompanhado muito a Vila Autódromo, quem tinha feito a vida lá, etc. O ponto alto é que ninguém esperava que a infraestrutura seria entregue na hora. Há grandes exceções, como o metrô, mas a maioria será entregue na hora certa. Resta saber se não foram cometidos crimes nessas obras. O fato de ser tudo entregue isso já é grande conquista.
Em julho do ano passado, uma análise foi encomendada pela Associated Press encontrou níveis perigosamente altos de vírus e bactérias de esgoto humano em locais de competições olímpicas e paralímpicas.
R$ 1 bilhão em segurança
O G1 cobrou um posicionamento da Polícia Federal e da Secretaria de Segurança sobre a opião dos correspondentes quanto a segurança durante os jogos, mas os dois órgão não quiseram se pronunciar.
Em novembro de 2015, o governo brasileiro assegurou que os atentados terroristas ocorridos em Paris não alterariam a preparação para os Jogos Olímpicos do Rio. No total, serão gastos quase R$ 1 bilhão em segurança.
“Vamos trabalhar adotando as melhores práticas globais em termos de segurança, investimentos, policiais treinados e capacitados como já fizemos na Copa, Confederações e outros eventos recentes”, explicou, na época, Andrei Rodrigues, secretário de Segurança para Grandes Eventos.
G1