Depois de 15 horas de votação, a maioria da Escócia votou “não” em plebiscito que definia separação política do Reino Unido. A apuração encerrou na madrugada desta sexta-feira (19), depois da abertura das urnas às 7h da quinta-feira (18). A aderência foi alta – 84.59% dos eleitores registrados compareceram às urnas para votar em plebiscito.
A decisão foi apertada. Enquanto 1.617.989 pessoas, ou seja, 44,7% votaram pela separação, o “não” contra a independência obteve 2.001.926 votos – 55,3% deles. A escolha pela permanência ao governo do Reino Unido ainda assim significa mudança, já que o país prometeu devolver mais poderes ao parlamento escocês.
A intenção de manter essa promessa foi reiterada pelo primeiro-ministro britânico, David Cameron após a divulgação do resultado. A aliança com a Inglaterra, formada em 1707, foi se tornando aos poucos um casamento sufocante e unilateral. A insatisfação cresceu a ponto de dar origem ao plebiscito, uma decisão histórica para ambos os países.
Para especialistas, o maior vencedor deste pleito foi a massa de cidadãos que se envolveu no debate eleitoral, após anos de apatia.
Uma terceira via teria surgido – que alguns ousam chamar de “Terceira Escócia” – a partir de grupos da sociedade civil que debateram o futuro do país.
“Formou-se uma coalizão de variadas origens sociais, políticas e ideológicas. Existe um imenso potencial de mudanças pela frente. Vamos viver uma nova era. O “antes” do plebiscito e o “depois” do plebiscito”, explicou ao GLOBO, o professor de Ciência Política e Social Philip Habel, da Universidade de Glasgow.
Daqui para frente, os tradicionais partidos políticos terão que se reinventar. Isso vale também para os trabalhistas, preferidos da população, com 41 das 59 cadeiras a que a Escócia tem direito no Parlamento britânico.
Para Habel, depois da excitação dos últimos dias, pode ser até que se criem novos partidos: “E os tradicionais têm que repensar a relação com o povo”.
Mobilização
Na Escócia, onde o voto não é obrigatório, 97% do eleitorado se cadastraram para ir às urnas. Nunca tantas pessoas tiveram interesse pela política. As próprias campanhas pelo “sim” e pelo “não” tiveram responsabilidade por isso. Foram atrás dos eleitores, bateram de porta em porta, ouviram as dúvidas durante os dois anos de campanha.
Nacionalistas, feministas, verdes, descontentes e sonhadores uniram-se em grupos independentes de campanha pela separação. Ficou tão clara a distância entre Edimburgo e Londres que o premier britânico, David Cameron, fez mea-culpa em cadeia nacional para avisar que não ficaria no cargo para sempre: nem ele, nem seu partido, que não é bem-visto no território escocês.
“Houve uma mobilização surpreendente. Isso tem que ser levado em consideração”, afirma o especialista em política do Reino Unido Ben Worthy, da Birkbeck University of London. Mas há outras consequências. Para Habel, o público cobrará como nunca, porque sente-se parte da História. E uma parcela enorme da população, dos derrotados nas urnas, vai querer ver promessas cumpridas.
O termômetro imediato será o desempenho da economia, e se os novos e mais amplos poderes serão suficientes para uma vida melhor. O fato é que milhões de escoceses percebem-se sem afinidade com o Reino Unido. Será preciso promover razões para os jovens se sentirem parte da união.
O colunista Matthew Paris, do jornal “The Times”, é mais radical: “A união acabou, quem quer que seja o vencedor.”
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