O Nordeste é uma região onde se crê, e a fé do nordestino em Deus ajuda a explicar a forma como nos inserimos no mundo. Para falar de devoção e tentar entender um pouco mais como somos, a Arquidiocese de Olinda e Recife e a Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) estão promovendo, em parceria, a exposição “Rogai por nós”, que acontece, nos salões do Museu de Arte Sacra de Pernambuco (Maspe), no Alto da Sé, em Olinda.
Quem visitar o espaço, até o mês de julho, vai se deparar com bibelôs de anjinhos, crucifixos, terços de madeira, imagens antigas e até saquinhos de São Cosme e São Damião. Ricos ou pobres, antigos ou atuais, todos representam a ligação com o Divino e estão expostos lado a lado, sem separação nem julgamentos. Afinal, como questiona Frei Rinaldo Pereira, diretor do Maspe, aos olhos de Nossa Senhora, haverá alguma diferença em relação ao valor das preces feitas diante de uma imagem barroca do século 17 e outra, de gesso, produzida na semana passada?
“Rogai por nós” mescla os acervos da Arquidiocese e do Museu do Homem do Nordeste (Muhne), uma das unidades de atuação da Fundaj, reforçando um dos propósitos da fundação: ocupar outros espaços e, assim, atingir novos públicos. A curadoria da mostra ficou a cargo da antropóloga Ciema Mello, que atua como museóloga do Muhne. Mas ela nega a autoria do projeto, explicando que uma grande equipe trabalhou conjuntamente.
“O Muhne é um museu de antropologia, e, portanto, sem ligações religiosas, mas damos muita atenção à forma como vivem aqueles que representamos. E o Nordeste seria incompreensível sem a presença de Deus, tão forte é a influência na vida das pessoas. Casa rica ou casa pobre, dificilmente você entra na morada de um nordestino e não encontra um pequeno oratório, seja uma imagem suntuosa, com resplendor e anel de prata, seja um santinho de papel comprado por cinquenta centavos”, aponta Ciema.
Ela não quis dar detalhes acerca da quantidade das peças que compõem a mostra. “Isso não é relevante, o importante é a representação da fé, a devoção de quem reza. O fiel é íntimo dos santos, a quem pede pela cura da doença, por ajuda na solidão, pelo ingresso na Universidade, pela aquisição da casa própria e até para ganhar no bicho e poder comprar um botijão de gás”, descreve.
Para Frei Rinaldo, que já promoveu diversas exposições de arte sacra no Maspe, o grande diferencial de “Rogai por nós” é justamente a parceria com a Fundaj. Ele ressalta que a mostra está estruturada de forma “muito provocativa”.
“As pessoas que vierem serão levadas a pensar, neste momento de mercado da fé onde há tantas propostas e tantas ofertas, se de fato a experiência de fé pode ser comprada ou adquirida a partir de um cheque que eu passo, ou se pode ser vivida como um dom de Deus”, critica, fazendo alusão à exploração da boa fé praticada por alguns segmentos religiosos.
Para ele, a exposição revela um diálogo entre as raízes antropológicas e a experiência da fé verdadeira, daquela que “está perto do Sagrado, do transcendente que é inerente a cada pessoa” e não pode ser comprada, e sim “vivenciada e conquistada sem ser por meio de uma campanha de proselitismo”. “Rogai por nós é uma expressão simples, mas que condensa todo o anseio de esperança na intercessão que aprendemos no seio de nossas famílias, no colo de nossos pais”, finaliza.