O primeiro Dia dos Pais de Gledson Pereira da Fonseca será marcado por descobertas e pela saudade. O morador de Marília (SP) perdeu a esposa Keila Quintiliano no dia 27 de junho, depois que ela deu à luz os gêmeos Maria Luiza e Samuel. Com a ajuda da mãe, da sogra e de amigos da igreja que a família frequenta, Gledson diz enfrentar, com muita fé, o misto de dor e alegria.
O parto dos bebês, que seguem internados na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) neonatal de Marília, foi feito às pressas.
“Fomos pro hospital porque ela estava sentindo falta de ar. Quando chegamos lá, foi descoberto um edema agudo no pulmão. Em seguida ela teve uma parada cardiorrespiratória, aí tiveram que fazer o parto imediatamente, com 36 semanas de gestação”, lembra Gledson. Keila morreu seis horas depois, sem conhecer os filhos.
Licença-maternidade
Depois da morte da esposa, a empresa onde Gledson trabalha como supervisor de operações de máquinas agrícolas entrou com um pedido no INSS para conceder a ele a licença-maternidade.
O pedido foi feito com base no artigo 392-B da lei 12.873, de 24 de outubro de 2013.
“Nem precisei me preocupar com isso, o pessoal da empresa, junto com o INSS, identificou a base legal e me concedeu o benefício”, afirma. Segundo Gledson, o caso dele é o primeiro na empresa e na base do INSS de Marília.
A licença dá direito a quatro meses de afastamento, mas a empresa ofereceu mais dois meses, devido a um programa de cidadania. Após os seis meses da licença, Gledson entrará de férias, totalizando sete meses sem trabalhar, tempo que poderá aproveitar integralmente os filhos.
“Neste período vou fazer o que minha esposa faria. Dar de mamar, cuidar e estabelecer um contato mais intenso com eles”, afirma.
Gestação
Keila teve dificuldades para engravidar e o casal precisou esperar quatro anos para que o sonho se concretizasse. O tratamento, que foi feito com inserção de hormônios, estimulou a liberação de óvulos e fez com que dois bebês viessem.
serem pais (Foto: Arquivo pessoal/ Alan Malheiro)
Segundo Gledson, os filhos têm a aparência da mãe. “A ficha está começando a cair quanto à paternidade. Eles são muito parecidos com a mãe. Esses dias que estou pegando eles no colo estou conhecendo cada detalhe do corpinho deles: dedinhos, sobrancelha, cheiro. Estou viciado no cheiro deles. Nessas horas eu penso, ‘é verdade, eu sou pai!’. Isso aumenta o peso da responsabilidade de como conduzir, orientar meus filhos nesse mundo maluco.”
A rotina diária de Gledson agora se concentra nas visitas aos filhos, que acontecem das 13h30 às 14h, e das 16h às 18h, quando ele e sua mãe, ou ele e a sogra, podem entrar na UTI e pegar os bebês no colo.
De acordo com o pai, os bebês estão bem. “Maria Luiza já está no berço. Ainda tem dificuldades para engolir a saliva, mas já respira sem a ajuda de aparelhos. Samuel também já respira sozinho, mas ainda está nos últimos dias de incubadora. O carinho da equipe coordenada pela Dra. Daniele Garbelini é imenso. Estou me sentindo em casa. Sinto que eles têm várias mães lá dentro”, disse Gledson.
Apoio
“Nós éramos muito cúmplices. Esperamos esta gravidez por quatro anos. Estava tudo planejadinho e, de repente, os planos foram interrompidos”, afirma Gledson sobre a morte da mulher.
“Homem nenhum aguenta isso por meios naturais, com sua estrutura psicológica. Eu continuo em pé por conta de Jesus. Aquela paz que excede todo entendimento veio”, desabafa.
Segundo ele, a família está recebendo muito apoio. Sem a mãe para alimentá-los, a igreja do casal iniciou uma campanha de arrecadação de leite materno.
“A campanha começou na igreja e tomou proporções regionais. Pessoas de Campinas, Vera Cruz, Garça e Pompéia vieram para Maríliafazer as doações. Agora o banco de leite tem estoque suficiente para alimentar os meus filhos e os outros bebês que estão internados também”, disse Gledson.
O apoio dos amigos e familiares tem sido fundamental para ajudar no processo de superação da perda. Ele conta que um casal da igreja que frequenta tem o acompanhado diariamente, e muitos convites para almoços e jantares têm surgido.
(Foto:Arquivo pessoal/ Gledson Pereira)
“Minha esposa era uma mulher maravilhosa, muito dedicada, zelava muito bem pela nossa casa, controlava nossas finanças, cuidava de todos os detalhes muito bem. Ela estava muito apaixonada pela gravidez, pelos filhos. Mas eu tenho uma vida espiritual ativa e um apoio dos amigos muito grande. Isso tem me dado uma força sobrenatural. Agora estou focado nos meus filhos e no desenvolvimento deles, no que vem pela frente.”
Familiares e amigos estão se organizando para trazer os bebês para a casa de Gledson, ajudá-lo a cuidar das crianças e a prosseguir com a vida. “Eu sou cuidado por pessoas da minha igreja desde 2007. Esse tempo todo me fez criar uma estrutura espiritual sólida e essencial para enfrentar esta fase”, diz.
“Vai ser dolorido nos primeiros meses, mas estou em pé, focado. A saudade pega ainda, mas não estou entrando em desespero. Sou muito consciente do meu papel como cabeça da minha família. Tenho segurança de onde minha esposa está agora. A base que eu recebi está me ajudando a passar por esta fase sem surtar”, finaliza.
Fonte: Portal G1