Um grupo de militares da reserva lançou um manifesto contra o documento feito pelos colegas que criticaram as ministras Maria do Rosário (Direitos Humanos) e Eleonora Menicucci (Mulheres), favoráveis à revogação da Lei da Anistia, e contra o ministro Celso Amorim (Defesa), que tentou enquadrar os Clubes Militares pelas censuras feitas à presidente Dilma Rousseff.
Articulado pelos capitães de mar e guerra Luiz Carlos de Souza e Fernando Santa Rosa, o documento obteve apoio de militares como o brigadeiro Rui Moreira Lima, que, aos 93 anos, tem uma história incomum. Herói da Segunda Guerra, é um dos dois únicos pilotos sobreviventes que participaram do 1.º Grupo de Aviação de Caça da Força Aérea Brasileira (FAB). Na teatro de operações da Itália, cumpriu 94 missões de combate e recebeu a Cruz de Combate (Brasil), a Croix de Guerre avec Palmes (França) e a Distinguished Flying Cross (EUA) por heroísmo.
Lima evita críticas ao presidente de seu clube – o da Aeronáutica -, o brigadeiro Carlos Almeida Batista. “Ele é um companheiro nobre e só deve ter assinado em solidariedade aos demais”. Mas diz apoiar a Comissão da Verdade. “Ela é necessária não para punir, mas para dar satisfação ao mundo e aos brasileiros sobre atos de pessoas que, pela prática da tortura, descumpriram normas e os mais altos valores militares”, diz Lima.
Intervenção. Lima e outros militares não concordam com a intervenção do governo nos Clubes Militares. Dizem que a reserva tem direito de se manifestar, mas nenhum deles se sente à vontade em assinar um manifesto na companhia de torturadores. “Eles citam o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra”, diz o professor da Unesp Paulo Cunha, pesquisador da caserna.
Segundo o professor, muitos oficiais da reserva – e, entre eles, generais – consideram que o governo foi inábil para resolver o caso dos manifestos dos Clubes Militares. “Esse novo manifesto mostra que o Clube Militar não é uma entidade monolítica, que há vozes discordantes.”
No manifesto, os capitães dizem que seus colegas da reserva não falam pelos da ativa e por muitos dos que estão na reserva. Santa Rosa é duro com os colegas do “outro manifesto”. Para ele, a força por trás do documento são “os fascistas, os saudosos da ditadura”. Ele critica o que considera “comportamento desrespeitoso, inaceitável na vida militar”, que configuraria “uma insubordinação, uma quebra de hierarquia”.
O documento dos capitães diz que “o verdadeiro regime democrático é o que estamos vivendo e não aquele dos governos militares”. “Torturadores (militares e civis), que não responderam a nenhum processo, encontram-se anistiados, permaneceram em suas carreiras sem nunca precisarem requerer, administrativa ou judicialmente, o reconhecimento dessa condição, diferentemente daqueles, suas vítimas, que até hoje estão demandando nos tribunais para terem os seus direitos reconhecidos”, escrevem.
O documento lembra aos colegas de caserna o que “se acha inscrito nos estatutos militares: exercer com autoridade, eficiência e probidade as funções que lhes couberem em decorrência do cargo; respeitar a dignidade da pessoa humana; ser justo e imparcial no julgamento dos atos e na apreciação do mérito dos subordinados”. Por fim, citam frase do antropólogo Darcy Ribeiro: “Só há duas opções nessa vida: se resignar ou se indignar”. E completam. “Eu não vou me resignar nunca”.
O Estado de S.Paulo