Por Adeilton Júnior
Vestidos com roupas brancas, caminhando e fazendo orações pelas ruas de Juazeiro. Esses são os cordões de penitentes, grupos de pessoas que fazem orações pelas almas perdidas e que se reúnem sempre durante a quaresma, período entre a Quarta-feira de Cinzas após o Carnaval oficial e o Sábado de Aleluia, na Semana Santa.
A penitência é considerada uma das práticas católicas mais antigas que tem como significado o sacrifício pessoal dos fiéis. Com esse ato, creem pagar por um pecado cometido ou mesmo agradecendo uma graça recebida, fato pelo qual antigamente se acreditava que por meio das flagelações no próprio corpo, a alma seria libertada.
Em Juazeiro não há registros que comprovem ao certo o início da penitência, nem quem são seus pioneiros. No entanto, alguns pesquisadores afirmam que a penitência começou na mesma época da fundação da cidade, no século XVIII, por capuchinhos e franciscanos, e credita-se a ambos a introdução da penitência na cidade.
Os cordões de penitentes se dividem em dois grupos, os Disciplinadores, conhecidos popularmente como os-que-se-cortam e as Alimentadeiras das Almas. As diferenças entre esses grupos vão muito além do autoflagelo, indo desde a vestimenta utilizada pelos integrantes de cada cordão, diferenças nos instrumentos até o percurso da caminhada realizado por cada tipo de cordão.
O aposentado Maximiano Dias de Carvalho, líder do cordão de Disciplinadores do bairro João XXIII, e penitente desde os 15 anos de idade, reforça o que a penitência significa em sua vida. “A penitência pra mim é tudo. Aqui é minha saúde, aqui é minha barriga cheia, é tudo para mim. Não se tem dinheiro, mas se tem paz, sossego, amor. Amor é amar ao próximo, é adquirir paz”, afirmou.
Ainda de acordo com Maximiano é preciso seguir algumas regras de conduta moral para poder participar de um cordão de disciplinadores. “Eu sempre aconselho eles a não beberem, não fazem coisa errada. […] Se eles beberem, eles não saem no cordão porque eu não deixo. Eles já sabem como é minha ordem”, explicou.
Alimentadeiras X Disciplinadores
Apesar de fazerem parte da mesma manifestação cultural e religiosa os grupos de penitentes Alimentadeiras das Almas e Disciplinadores se diferenciam em alguns pontos.
As Alimentadeiras das Almas reúnem-se durante as noites da quaresma na Casa de Oração, geralmente é a casa do líder do cordão, onde ficam concentrados. Assim, iniciam-se os ritos de oração antes de percorrerem as ruas entoando os benditos (espécie de orações cantadas) para guiar as almas.
Estes cordões saem às ruas por volta das 20h. Os participantes caminham um atrás do outro, formando uma fila indiana, trajando uma espécie de mortalha, algo parecido com um lençol branco que os cobre dos pés até a cabeça, deixando apenas os olhos de fora. À frente do grupo encontra-se o madeiro, uma cruz de madeira batizada numa igreja católica, carregada por um integrante do cordão.
Já os Disciplinadores são grupos compostos apenas por homens adultos. Diferente das Alimentadeiras, eles saem por volta das 23h, quando não há muitas pessoas nas ruas, vestindo uma espécie de toalha, mais parecido com uma anágua, amarrada na cintura e um capuz cobrindo a cabeça. Esse grupo adota o exercício da autoflagelação, que consiste em se cortarem com chicotes com lâminas nas pontas, causando cortes geralmente nas costas, e derramando sangue.
Segundo Isabel Souza, autora do livro ‘Penitentes: Uma chama de fé’, os Disciplinadores têm sua origem na Idade Média, quando a flagelação era usada como meio de purificação do castigo.