Reduzir ministérios contribui pouco para corte de gastos, mas tem poder simbólico

Atendendo a pressões de políticos e da opinião pública, o governo Dilma Rousseff anunciou nesta segunda-feira que vai cortar dez de seus 39 ministérios até final de setembro.

Embora a medida tenha o valor simbólico de demonstrar que o governo está “cortando na própria carne”, não produzirá impacto relevante no sentido de melhorar as contas públicas e viabilizar um ajuste fiscal mais robusto, afirmam economistas ouvidos pela BBC Brasil.

Isso acontece porque a grande maioria dos gastos do governo está concentrada em poucos ministérios, principalmente na área social. Boa parte são despesas obrigatórias – com saúde, educação, aposentadorias – que não podem ser reduzidas com uma mera canetada.

“Na prática, o que é isso perto do que o governo gasta com juros, perto de outras despesas que não podem ser cortadas? É mais simbólico, mas um simbolismo que ajuda, ainda mais num momento em que o governo está pedindo sacrifícios continuamente à população, aos empresários. E pode até aumentar a carga tributária no ano que vem”, avalia Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor do Banco Central e hoje chefe da divisão econômica da Confederação Nacional do Comércio (CNC).

Para o economista, o esforço do governo pode servir de argumento contra a aprovação de leis, no Congresso, que aumentem os gastos públicos.

“Eu acho que essa medida do governo é muito importante para evitar pautas bombas. Se ele mesmo está dando demonstração de que está cortando, como você vai ter pauta bomba no Congresso?”, questiona.

Maiores gastos

O especialista em contas públicas Mansueto Almeida, economista licenciado do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), calcula que apenas cinco ministérios – Educação, Saúde, Previdência Social, Desenvolvimento Social e Trabalho – responderam por 89% dos gastos de custeio do governo de janeiro a maio deste ano.

Ou seja, do total de R$ 312,8 bilhões aplicados no funcionamento da máquina pública, R$ 268,66 bilhões foram consumidos por essas cinco pastas, em gastos com aposentadorias, seguro-desemprego, Bolsa Família, hospitais, universidades etc.

Outra fatia importante dos gastos foram as despesas com encargos especiais (R$ 26,3 bilhões) – por exemplo, recursos para cobrir perdas da Previdência com a desoneração da folha de pagamento, subsídios para compensar juros mais baixos praticados pelo BNDES ou pagamento de precatórios (decisões judiciais contra a União).

Esses gastos, somados às despesas dos cinco principais ministérios, representaram 94,3% dos dispêndios de custeio nos cinco primeiros meses do ano, segundo Almeida.

Além do custeio, o governo tem gastos elevados com juros da dívida e com pessoal, despesas que também não podem ser cortadas facilmente – a maioria dos funcionários públicos é concursada e tem estabilidade, enquanto o pagamento de juros está previsto em contratos cujo rompimento provocaria uma fuga de investidores que financiam o governo por meio de títulos públicos.

Outras despesas obrigatórias, como previdência e seguro-desemprego, só podem ser reduzidas alterando leis por meio do Congresso, em votações altamente impopulares.

Mais tributos

Diante da dificuldade para cortar gastos, a expectativa é de que o governo eleve tributos para tentar alcançar um superávit primário maior no ano que vem – para este ano a meta foi reduzida de 1,1% do PIB para apenas 0,15%. Está em estudo, por exemplo, taxar mais as grandes fortunas.

O objetivo dessa economia – o superávit primário – é pagar juros da dívida pública, evitando que ela cresça em relação ao PIB (Produto Interno Bruto). A estabilidade da dívida é considerada importante para manter a oferta de crédito para o governo, a juros menores. Seu crescimento descontrolado pode afastar investidores dos títulos públicos, elevando as taxas pagas pelo Tesouro Nacional.

“Num momento em que o governo está tomando medidas difíceis, cortando gastos sociais e, eventualmente, até tendo que aumentar impostos, acho que cortar (ministérios), mesmo que o impacto fiscal seja pequeno, é uma medida positiva. Mas significa que vai ficar mais próximo de cumprir o superávit primário no próximo ano? Não”, destaca Almeida.

Um aumento da arrecadação depende também de uma recuperação da economia. No entanto, o especialista nota que, mesmo que o PIB comece a se recuperar, o impacto sobre a arrecadação não deve ser tão significativo como no governo Lula (2003-2010).

Isso porque boa parte do crescimento do valor recolhido pela Receita Federal naquele período foi resultado da formalização do mercado de trabalho, com abertura de mais vagas de emprego com carteira assinada.

Para que esse processo seja retomado, é preciso uma forte recuperação da economia, o que não parece provável no curto prazo.

Secretarias

As críticas ao número grande de ministérios partem não só de partidos de oposição, como o PSDB, mas também do principal aliado do governo, o PMDB, que hoje comanda seis pastas.

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), já fez essa cobrança diversas vezes e disse publicamente que não queria cargos, embora nos bastidores tenha manifestado irritação quando seu aliado Vinicius Lages foi desalojado do Turismo em abril para nomeação de outro peemedebista, Henrique Eduardo Alves, ex-presidente da Câmara.

Em 2002, último ano do governo FHC, o governo federal tinha 24 ministérios. O número cresceu ao longo dos governos Lula e Dilma e hoje está em 39.

Nos mandatos petistas foram criadas pastas como as secretarias de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, de Políticas para as Mulheres, dos Portos, da Pesca, de Aviação Civil, de Micro e Pequena Empresa e de Assuntos Estratégicos, todas com status de ministério.

Foram criados também os ministérios das Cidades e do Desenvolvimento Social e desmembradas outras pastas, como o Ministério do Esporte e Turismo, que deu origem a dois órgãos separados.

O que pode acontecer agora é que algumas dessas secretarias sejam eliminadas ou incorporadas por outras – a de Direitos Humanos, por exemplo, poderia absorver as políticas focadas na igualdade racial e de gênero.

Porém, isso provavelmente despertará resistência e críticas de movimentos sociais da base do governo, que consideram importantes a existência desses ministérios para dar visibilidade à luta das minorias.

Fonte: MSN Notícias

Leave a Comment

Your email address will not be published.

Política Relevantes

Mercosul e União Europeia firmam acordo comercial negociado há 25 anos

post-image

Os chefes de Estado do Mercosul e a representante da União Europeia (UE), Ursula von der Leyen, anunciaram, nesta sexta-feira (6), que foi firmado o acordo de livre comércio para redução das tarifas de exportação entre os países que compõe esses mercados. As negociações se arrastavam há 25 anos.

O acordo foi anunciado em coletiva de imprensa em Montevidéu, no Uruguai, onde ocorre a 65ª Cúpula de Chefes de Estado do Mercosul.

Com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva; do presidente argentino, Javier Milei; do Uruguai, Luis Alberto Lacalle Pou; e do Paraguai, Santiago Peña, foi anunciado que as negociações foram concluídas para regras de livre comércio entre os países dos blocos. Ao todo, o acordo envolve nações que somam mais de 750 milhões de pessoas.

A presidente da União Europeia destacou que a medida marca o…

Read More
Política Relevantes

Quaest: Governo Lula tem avaliação negativa para 90% do mercado financeiro, e Haddad tem avaliação positiva para 41%

post-image

A reprovação do governo Lula (PT) entre os agentes do mercado financeiro cresceu e chegou a 90%, segundo uma pesquisa Quaest divulgada nesta quarta-feira (4).

No último levantamento, feito em março, a reprovação era de 26%.

Outros 3% avaliam o governo Lula como positivo (eram 6% em março) e 7%, como regular (eram 30%).

O levantamento ouviu 105 gestores, economistas, analistas e tomadores de decisão do mercado financeiro em fundos de investimento com sede em São Paulo e no Rio de Janeiro entre os dias 29 de novembro a 3 de dezembro.

A margem de erro é de 3,4 pontos percentuais para mais ou para menos. O levantamento foi encomendado pela Genial Investimentos.

Números são reação a pacote de gastos, diz diretor da Quaest

Juazeiro Política Relevantes

“A Bahia se consolidará como um dos principais centros de inovação e geração de empregos do Brasil”, destaca governador durante visita as obras da fábrica da BYD

post-image

As obras da nova fábrica da BYD em Camaçari, iniciadas em março de 2024, seguem dentro do cronograma estabelecido com o Governo do Estado.

O projeto consolida a Bahia como um polo no setor de veículos elétricos e híbridos, com a previsão de gerar 10 mil empregos diretos até o final de 2025, após o início da operação.

Nesta segunda-feira (2), o governador Jerônimo Rodrigues, a CEO da BYD para as Américas e Europa, Stella Li, e o ministro da Casa Civil, Rui Costa, visitaram o canteiro de obras para acompanhar o progresso.

——— MATÉRIA CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE ———

A operação industrial terá início em janeiro, com 2 mil vagas iniciais. Esse número será ampliado para 3 mil até março, totalizando os 10 mil ao final…

Read More
Política Relevantes

Os alertas de guerra na Europa que preocupam o mundo

post-image

Alertas feitos por autoridades europeias sobre a necessidade de o continente se preparar para um possível conflito têm elevado os níveis de tensão na região.

Na segunda-feira (25), um oficial da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) instou empresas na Europa a se prepararem para um cenário de guerra e a ajustarem suas linhas de produção e distribuição, a fim de ficarem menos vulneráveis ​​à chantagem de países como Rússia e China.

“Se pudermos garantir que todos os serviços e bens cruciais possam ser entregues, não importa o que aconteça, isso será uma parte fundamental da nossa dissuasão”, disse o presidente do comitê militar da Otan, o almirante holandês Rob Bauer, segundo a agência Reuters.

Em um evento em Bruxelas, Bauer se mostrou preocupado sobre uma possível dependência europeia em…

Read More
Política Relevantes

Taxa de desemprego atinge menor patamar desde 2012

post-image

A taxa de desocupação no país, também conhecida como taxa de desemprego, ficou em 6,2% no trimestre encerrado em outubro deste ano. A taxa é a menor registrada desde o início da série histórica da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, em 2012.

O trimestre anterior, encerrado em julho deste ano, havia registrado taxa de 6,8%. Em outubro do ano passado, havia ficado em 7,6%.

A população ocupada (103,6 milhões) também atingiu recorde, ficando 1,5% acima da média do trimestre encerrado em julho e 3,4% superior a outubro.

A população desocupada recuou para 6,8 milhões, ou seja, 8% a menos (menos 591 mil pessoas) em relação ao trimestre anterior e 17,2% inferior a outubro de 2023 (menos 1,4 milhão de pessoas). É o menor contingente de desocupados desde o trimestre encerrado…

Read More
Política Relevantes

Narrativa golpista levou ao 8 de janeiro e atentado a bomba, diz PF

post-image

A Polícia Federal (PF) concluiu que a disseminação de narrativas golpistas durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro propiciou o recente atentado com um homem-bomba no Supremo Tribunal Federal (STF) e os atos golpistas de 8 de janeiro de 2023

A conclusão está no relatório no qual a PF indiciou Bolsonaro e mais 36 acusados por golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito. O sigilo foi derrubado na terça-feira (26) pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, relator do chamado inquérito do golpe.

Na avaliação dos investigadores responsáveis pela conclusão do inquérito, a difusão de “forma rápida e repetitiva” de narrativas golpistas mantiveram o desejo de grupos extremistas de consumação do golpe que teria sido planejado pelo ex-presidente e seus aliados, mas não…

Read More
Política Relevantes

Julgamento de Bolsonaro e demais indiciados pode ocorrer em 2025

post-image

O inquérito da Polícia Federal (PF) que indiciou o ex-presidente Jair Bolsonaro e mais 36 acusados por golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito será enviado à Procuradoria-Geral da República (PGR) nos próximos dias.

Esse o primeiro passo que o inquérito vai seguir após chegar ao gabinete do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, relator da investigação.

Caberá ao procurador-geral da República, Paulo Gonet, no prazo de 15 dias, decidir se Bolsonaro e os demais indiciados serão denunciados ao Supremo pelas acusações. As defesas dos investigados também deverão se manifestar.

Devido ao recesso de fim de ano na Corte, que começa no dia 19 de dezembro e termina em 1° de fevereiro de 2025, a expectativa é a de que o julgamento da…

Read More
Política Relevantes

Tribunal Penal Internacional emite prisão para Netanyahu e líderes do Hamas

post-image

O Tribunal Penal Internacional emitiu mandados de prisão, nesta quinta-feira, 21, contra o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, o ex-ministro da Defesa Yoav Gallant e integrantes da cúpula do Hamas, acusando-os de crimes de guerra e crimes contra a humanidade devido à guerra em Gaza e aos ataques de outubro de 2023 que desencadearam a ofensiva de Israel na Palestina.

A decisão transforma Netanyahu e os outros em suspeitos procurados internacionalmente e é provável que os isole ainda mais e complique os esforços para negociar um cessar-fogo para pôr fim ao conflito de 13 meses. Mas as suas implicações práticas podem ser limitadas, uma vez que Israel e o seu principal aliado, os Estados Unidos, não são membros do tribunal e vários integrantes do Hamas foram posteriormente mortos no conflito.

Netanyahu e outros líderes israelenses condenaram o pedido…

Read More