Em uma experiência inovadora de construção coletiva, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) abriu espaço para a sociedade civil participar de forma ativa da avaliação e elaboração de seus projetos. A iniciativa está em consonância com a proposta do principal tema em questão – a agroecologia e a agrobiodiversidade –, que pressupõe que os saberes populares estejam aliados aos saberes da ciência.
As discussões tiveram início no workshop “Agrobiodiversidade e Agroecologia no Nordeste”, realizado entre os dias 15 e 17 de maio em Petrolina (PE), em uma parceria entre a Embrapa e o Ministério do Meio Ambiente (MMA). O evento reuniu pesquisadores das Unidades da Embrapa que atuam na região (Agroindústria Tropical, Algodão, Caprinos e Ovinos, Cocais, Mandioca e Fruticultura, Meio Norte, Semiárido e Tabuleiros Costeiros), organizações governamentais e não governamentais, universidade e movimentos sociais.
Para subsidiar os trabalhos, foram apresentados os projetos voltados para a agricultura familiar no Nordeste que estão em andamento na empresa ou que já foram finalizados. Todos eles foram avaliados pelos representantes da sociedade civil, que, com essas informações e com as experiências acumuladas, levaram ao debate suas propostas, críticas e sugestões.
“Nós consideramos que foi uma iniciativa muito interessante, principalmente olhando para o conjunto de pessoas que tem discutido o tema”, observa Neilda Pereira, secretária executiva da Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA – Pernambuco). Ela destaca especialmente a participação dos produtores, que são os reais protagonistas das ações em agroecologia: “Não estamos fazendo para essas pessoas, mas construindo com eles e elas esse conhecimento a partir das experiências e a partir, sobretudo, da vontade que esse povo tem de viver nessa região, de construir alternativas e contribuir para as políticas públicas”.
A necessidade de ações mais participativas também foi reforçada pelos agricultores presentes no evento. “A gente sofre muita intervenção de políticas públicas, e elas têm sido erosivas em vários aspectos, porque vêm de cima para baixo e não dialogam com as experiências locais”, afirma Euzébio Cavalcanti, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Remígio (PB). Para ele, a pesquisa tem um papel muito importante na mudança desse cenário, pois se ela passa a ser transversal, com o tempo as políticas públicas também vão seguir o mesmo caminho, contribuindo para a construção da diversidade.
As trocas de informações e de experiências que ocorreram no evento também foram bem avaliadas pelos pesquisadores da Embrapa. “É interessante porque amplia a nossa visão e as nossas parcerias com os agricultores e as organizações sociais, permitindo que possamos colaborar mais nos projetos deles, assim como eles podem colaborar nos nossos”, declara Aldete Ferreira, da Embrapa Semiárido.
Para o pesquisador Altair Toledo Machado, gestor do Macroprograma 6 da Embrapa voltado para a agricultura familiar, essa aproximação com os produtores vai permitir “construir projetos mais integrados, nos conectar adequadamente aos problemas deles, desenvolver projetos ou lacunas que ainda não foram trabalhadas e potencializar aquelas ações que são demandas reais dos agricultores.”
Diagnóstico – Do encontro entre Embrapa e sociedade civil resultou a formação de um grupo paritário, com oito membros (4 da Embrapa e 4 da sociedade civil), que fica responsável por dar continuidade à discussão e às ações dos projetos em agroecologia e agrobiodiversidade. A primeira missão será a realização de uma sistematização da agrobiodiversidade no Nordeste, com um levantamento das plantas, nativas ou domesticadas, utilizadas ou conservadas pelos agricultores da região.
Esse diagnóstico é uma das metas do Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo), que integra a Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PNAPO), lançada em 2012 pelo Governo Federal, após longo processo de diálogo com a sociedade civil. Sua finalidade é integrar, articular e adequar políticas, programas e ações indutoras da transição agroecológica e da produção orgânica e de base agroecológica.
Sua implementação, em nível nacional, é coordenada pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) e a Embrapa participa, entre diversas outras ações, da realização desse diagnóstico. Por esta razão o MMA, além de apoiar a realização do workshop, também esteve representado no evento por Claudia de Souza, da Secretaria de Extrativismo e Desenvolvimento Rural Sustentável (SEDR), que apresentou aos participantes a Política e o Plano, dando subsídio para a realização dos debates.
A previsão é de que a sistematização da agrobiodiversidade na região Nordeste seja realizada até o mês de outubro. A partir de então, servirá de base tanto para a realização de ações do Planapo quanto para a continuidade da discussão entre a Embrapa e a sociedade civil para a elaboração de projetos integrados de pesquisa com foco em agroecologia e agrobiodiversidade.