O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou, na quarta-feira, 19, o julgamento das doze ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) que questionam diversos pontos da reforma da Previdência de 2019, projeto apresentado pelo governo de Jair Bolsonaro (PL). Os ministros e ministras formaram maioria para derrubar alguns pontos da reforma; a progressividade da alíquota tem sua votação empatada até o momento. Faltando apenas o seu voto para ser apresentado, o ministro Gilmar Mendes pediu vista. Embora haja algumas definições numéricas, todos os votos ainda podem ser modificados até a conclusão do julgamento.
Com os votos desta quarta, os ministros e ministras formaram maioria para derrubar a contribuição extraordinária e a contribuição sobre o que superar o salário mínimo para aposentados e aposentadas. Também formou maioria pela inconstitucionalidade das diferenças de tratamento entre mulheres servidoras e da iniciativa privada. Por outro lado, também foi formada maioria pela constitucionalidade do fim da “imunidade do duplo teto” e das mudanças na forma de cálculo da pensão por morte.
Estão sendo votadas em julgamento conjunto, por temas correlatos, as ADIs de números 6.254, 6.255, 6.256, 6.258, 6.271, 6.279, 6.289, 6.361, 6.367, 6.384, 6.385 e 6.916, que tratam de diversos temas de interesse de colegas aposentados, aposentadas e pensionistas, além de servidores e servidoras da ativa. Na abertura da sessão, o presidente do Supremo e relator das matérias, ministro Luís Roberto Barroso, releu o resumo de seu voto, no qual recusou todas as ações, defendendo a constitucionalidade da emenda constitucional 103/2019, da reforma da Previdência. Barroso também resumiu os votos seguintes, dos ministros Edson Fachin, Rosa Weber e Dias Toffoli, que divergiram do relator e apontaram inconstitucionalidade de alguns pontos.
Fachin votou especificamente pela inconstitucionalidade de cinco itens da reforma: as contribuições acima do salário mínimo para aposentados, aposentadas e pensionistas; a possibilidade de contribuição extraordinária em situações de déficit atuarial; a alíquota progressiva aplicada a servidores e servidoras; a diferença de tratamento entre trabalhadoras do regime geral e servidoras públicas (Fachin defendeu a extensão, assim, da forma de cálculo do regime geral para o regime próprio); e a nulidade das aposentadorias já concedidas a membros do Ministério Público e magistrados que não comprovaram contribuição durante o período de advocacia. A ministra Rosa Weber e o ministro Dias Toffoli acompanharam o voto de Fachin.
O voto de Moraes
O ministro Alexandre de Moraes pedira vista ainda em dezembro de 2023, devolvendo os processos em 23 de abril de 2024, data desde a qual as ADIs aguardam a retomada do julgamento, confirmada finalmente nesta quarta-feira, 19. Agora, concordou parcialmente com o ministro Edson Fachin para declarar inconstitucionais alguns dos itens da reforma.
Moraes abriu sua fala destacando que há “vários preconceitos com relação à questão previdenciária e versões de que toda a culpa acaba sendo do trabalhador”. Sobre o alegado déficit previdenciário, Moraes defendeu que “esse déficit seria contornado se 32% de isenções tributárias que não precisariam mais existir fossem revogadas”, e disse que as seguidas reformas da Previdência não foram solução.
Depois, apresentou argumentos sobre cada um dos pontos discutidos pelas ADIs. Em relação a aposentados e aposentadas, às mudanças no cálculo das contribuições e à contribuição extraordinária, ele avaliou que o tratamento da reforma é “confiscatório” e sobrecarrega os inativos. E concluiu seu voto alinhando-o à posição de Fachin em quatro dos cinco itens nos quais este discordou de Barroso – a exceção foi a progressividade das alíquotas, que Moraes considerou constitucional.
Em relação à mudança no cálculo da pensão por morte, outro ponto questionado pelas ADIs, Moraes votou pela constitucionalidade, mas criticou a medida: “não vislumbro inconstitucionalidade, mas essa não é uma boa regra. Ela leva em conta cálculos matemáticos, mas não leva em conta a vida real”. E concluiu que “do ponto de vista político e institucional, talvez o Congresso Nacional precisasse repensar essa norma”.
O voto de Zanin
Após o voto de Moraes, o ministro Cristiano Zanin apresentou seu voto. Zanin acompanhou Barroso, reconhecendo a constitucionalidade dos itens questionados pelas ADIs e pelos ministros que divergiram do relator. Para Zanin, o alegado déficit da Previdência “impressiona”, e a reforma da Previdência de 2019 buscou atender ao artigo 201, “que faz expressa referência aos critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial da Previdência”. Zanin discordou de Barroso apenas no que se refere ao tema da nulidade de aposentadorias já concedidas a membros do Ministério Público e magistrados que não comprovaram contribuição durante o período de advocacia.
Os votos de Cármen Lúcia e André Mendonça
A seguir, quem votou foi a ministra Cármen Lúcia. Ela acompanhou integralmente a divergência apresentada por Fachin, ressaltando a defesa dos mesmos princípios que fundamentaram o voto do ministro: a solidariedade, as regras que garantam essa solidariedade e o fato de que o modelo previdenciário não pode desnaturar os fundamentos dos princípios constitucionais. Depois, o ministro André Mendonça votou da mesma forma, acompanhando Fachin.
O voto de Nunes Marques
Depois de André Mendonça, quem votou foi o ministro Nunes Marques. Ele acompanhou o voto de Barroso, pela constitucionalidade de todos os itens questionados, com exceção da questão da nulidade das aposentadorias já concedidas a membros do Ministério Público e magistrados que não comprovaram contribuição durante o período de advocacia, tema no qual acompanhou Fachin.
O voto de Fux
O último voto apresentado foi o do ministro Luiz Fux. Ele entendeu pela inconstitucionalidade da contribuição extraordinária e da diferença na base de cálculo das servidoras públicas para as trabalhadoras do setor privado. Também apontou como inconstitucional a nulidade das aposentadorias dos membros do MP e dos magistrados que não comprovaram contribuição durante o período de advocacia, nos termos do voto de Fachin. Fux concordou com Barroso nos outros temas, definindo como constitucionais medidas como a mudança no cálculo da contribuição de aposentados, aposentadas e pensionistas e a progressividade das alíquotas.
Gilmar Mendes pede vista
Após o voto de Fux, o ministro Gilmar Mendes pediu vista do processo, o que empurra a finalização do julgamento para uma futura sessão do STF. Ainda antes do encerramento, o ministro Alexandre de Moraes pediu a palavra para dizer que deverá reavaliar, nesse intervalo de julgamento, a questão da pensão por morte – Moraes diz ter dúvidas sobre sua constitucionalidade.
Como ficaram os resultados?
Com os dez votos já apresentados, restou indefinida apenas a questão da progressividade das alíquotas. Sobre esse tema, o placar está em cinco a cinco, dependendo-se apenas do voto de Gilmar Mendes – votaram a favor dos servidores as ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia e os ministros Edson Fachin, Dias Toffoli e André Mendonça.
Por sua vez, o STF formou maioria para derrubar dois ataques aos aposentados, aposentadas e pensionistas: a possibilidade de implementação, para eles, de contribuição extraordinária em caso de déficit atuarial; e, neste mesmo caso, a definição de que “a contribuição ordinária dos aposentados e pensionistas poderá incidir sobre o valor dos proventos de aposentadoria e de pensões que supere o salário mínimo” – atualmente, a contribuição incide sobre os valores que superam teto do RGPS. O Supremo também formou maioria para tornar inconstitucional a diferença de tratamento entre trabalhadoras do regime geral e servidoras públicas, de maneira que a forma de cálculo do regime geral nesses casos deve ser estendida para o regime próprio.
Por outro lado, os ministros também formaram maioria para declarar a constitucionalidade do fim da “imunidade do duplo teto” e das mudanças na forma de cálculo da pensão por morte.Com informações
Sintrajufe/Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil