Um vídeo inédito e exclusivo pode mudar o que se sabe sobre o desastre que matou Thomaz Alckmin, o filho do governador de São Paulo, no mês passado. Os repórteres do Fantástico tiveram acesso às últimas imagens do helicóptero e das cinco pessoas que morreram na queda. Segundo especialistas, algo estranho aconteceu logo que o helicóptero levantou voo.
Dentro do helicóptero estavam cinco pessoas. Uma delas é Thomaz, 31 anos, filho mais novo do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. A aeronave começa a taxiar, andar pelo pátio. Logo em seguida, ela dá um pequeno tranco, e se desloca por mais alguns metros. Depois, decola de forma brusca, e vira imediatamente para o lado esquerdo.
“Opa, você vê que foi uma decolagem meio esquisita. Ele quase que perdeu aparentemente o controle do helicóptero ali”, analisa Roberto Peterka, investigador de acidentes aéreos.
Minutos depois, acontece o desastre.
As últimas imagens das vítimas foram gravadas pelas câmeras do Helipark, um centro de manutenção em Carapicuíba, na Grande São Paulo.
Fazia 51 dias que a aeronave estava em uma oficina, para uma inspeção que é realizada de dois em dois anos. Um dos reparos ocorreu nas cinco pás do rotor principal. Elas foram retiradas e passaram por manutenção na Helibras, que representa o fabricante do modelo no Brasil. Depois, no Helipark, as pás foram recolocadas.
Dia 2 de abril, quinta-feira, 16h. As imagens obtidas com exclusividade pelo Fantástico registram o que aconteceu a partir desse horário. Com as cinco pás já instaladas, os funcionários fazem os últimos testes. Por uma câmera, parece que as pás estão um pouco inclinadas, até girando meio tortas. É que a imagem fica distorcida por causa do ângulo e do tipo de lente da câmera.
Quem faz os reparos no helicóptero são os mecânicos Erick Martinho e Paulo Henrique de Moraes, e também o auxiliar de manutenção Leandro de Souza Santos.
O piloto, Carlos Haroldo Esquerdo, acompanha tudo. Com 30 anos de experiência, ele comandava esse modelo havia quatro anos.
O Fantástico mostrou as imagens para três especialistas do Brasil. Um é professor de Engenharia Aeronáutica da USP. O segundo já investigou mais de 1,3 mil acidentes aéreos, e fez parte do Cenipa, o órgão responsável pelas investigações dos desastres. O terceiro é engenheiro mecânico e piloto de helicópteros, inclusive de modelos iguais ao que caiu.
“Eles estão agora concentrando os esforços no rotor de cauda. Para medir vibração e também consegue ver o posicionamento das pás”, afirma Fernando Catalano, professor de engenharia aeronáutica da USP, ao analisar as imagens.
O Fantástico também mostrou as imagens para Razvan Rusovici, professor de engenharia aeroespacial da Universidade da Flórida, Estados Unidos. Analisando a movimentação, ele diz que os mecânicos podem ter encontrado algum problema no rotor de cauda.
O especialista explica que, em 2013, a agência americana de aviação publicou um alerta obrigando os donos de helicópteros desse modelo a fazer uma inspeção imediata no rotor de cauda. Segundo ele, foram encontradas rachaduras em aeronaves que tinham se acidentado.
Nas imagens do centro de manutenção, às 16h36 do dia 2 de abril, aparece Thomaz Alckmin. O filho do governador de São Paulo era piloto profissional de helicópteros. Segundo a Agência Nacional de Aviação Civil, Thomaz tinha habilitação para pilotar dois modelos, que são menores e menos potentes que a aeronave que passava por manutenção.
Faltando cerca de oito minutos para a decolagem, o piloto Carlos Haroldo Esquerdo entra no helicóptero, de fabricação francesa para 10 pessoas. Nas imagens, dá para ver que Thomaz Alckmin se posiciona na parte da frente, no lugar do copiloto.
“Ele entrou na frente. Ele estaria ali ocupando uma posição de tripulante”, diz Roberto Peterka, investigador de acidentes aéreos.
“Todos os equipamentos que têm do lado do comandante, do lado direito, ele também possui do lado esquerdo. Os comandos são iguais dos dois lados. Pode-se decolar de qualquer lado”, explica Maurício Kessar, piloto de helicóptero.
Na sequência, entram na parte de trás os dois mecânicos e o auxiliar de manutenção. A Anac determina que nenhuma pessoa pode transportar qualquer pessoa – exceto tripulantes – em uma aeronave que tenha sofrido manutenção. “Existe um pequeno risco e por que que vai se correr o risco de ferir alguém que não é necessário a bordo?”, argumenta Robert Peterka.
Os mecânicos são considerados tripulantes, por isso podem estar no helicóptero. Mas existe também uma ressalva na própria regra da Anac. Ela diz que a aeronave pode levar passageiros desde que antes de voar, as inspeções e testes de solo concluírem que as manutenções não alteraram substancialmente as características de voo, nem afetaram a operação.
Ainda não se sabe quais manutenções e inspeções foram feitas. Isto está sendo investigado pela comissão que estuda o acidente.
Pelas imagens, não é possível saber com certeza se foram feitos todos os testes do rotor de cauda e do rotor principal. E ainda existem outros procedimentos, igualmente obrigatórios.
Fernando Catalano, professor de engenharia aeronáutica: Na verdade, são 4 fases: no solo, pairado próximo ao solo, pairado a uma certa altitude.
Fantástico: De quanto é essa altitude?
Fernando Catalano: De 100 metros ou até menos que isso. E depois para o voo horizontal.
Fantástico: Voo pairado, o que é?
Fernando Catalano: É um voo sem velocidade horizontal. Ele tá pairado no ar.
O Fantástico apurou que, depois de todos terem embarcado, o piloto Carlos Haroldo Esquerdo pediu autorização a um funcionário da Helipark para levar o helicóptero até o heliponto da empresa. As checagens de voo pairado são realizadas em um lugar onde também acontecem os pousos e decolagens.
Às 17h03, o helicóptero com as cinco pessoas a bordo começa a se movimentar em direção ao heliponto. Tudo indicava que era só para fazer os testes. Mas, de repente…
Maurício Kessar, piloto de helicóptero: Opa. É uma decolagem estranha.
Fantástico: Por quê?
Maurício Kessar: Eu acho que ele deveria ter taxiado o helicóptero ou um pouco mais devagar.
Roberto Peterka, investigador de acidentes aéreos: É de se estranhar que essa manobra tenha sido feita por um piloto experiente. O razoável era que ele pousasse no heliponto e fizesse o voo pairado para depois prosseguir.
Para o professor dos Estados Unidos, um piloto com experiência dificilmente decolaria assim, já que foi de forma brusca.
Mas para quem investiga acidentes aéreos, a decolagem estranha também pode ter acontecido devido a uma ressonância de solo, que é uma vibração muito forte, fora do normal. É o que ocorre em outro vídeo mostrado na reportagem. A ressonância pode ser causada por problemas nos amortecedores do rotor ou até um pneu murcho.
“O piloto tem que tirar o helicóptero daquela situação imediatamente, porque a ressonância volta para o helicóptero e destrói o helicóptero antes dele decolar. Ele poderia ter voltado e pousado no heliponto”, explica Roberto Peterka.
E o que teria acontecido depois, com o helicóptero voando? No dia 3 de maio, o Fantástico revelou que pelos menos uma das pás se quebrou em pleno voo.
Como uma máquina de cinco toneladas extremamente segura tem uma pá quebrada no ar? Houve falha mecânica? Erro humano? Ainda não há respostas oficiais para estas perguntas. Mas a Aeronáutica informou que o helicóptero voou de 4 a 5 minutos antes de cair. E revelou também que um mês da queda, uma peça da aeronave – considerada importante para a investigação – foi encontrada.
Trata-se da quinta pá do helicóptero, que foi achada no topo de uma árvore, no dia 10 passado. “Pode ter aberto em voo. Por algum problema da composição dela, alguma falha que possa ter acontecido durante a manutenção dela”, diz o investigador Roberto Peterka.
A Helibrás – responsável pelos reparos nas pás – informou que só vai se manifestar depois que a investigação for concluída.
O Helipark – o centro de manutenção de onde o helicóptero decolou – disse que não identificou nenhuma falha em seu procedimento e que não poupará esforços para colaborar com as autoridades até o encerramento das investigações. Os donos da aeronave não quiseram se manifestar. Por enquanto, a causa do acidente ainda é um mistério.
“Toda peça é importante. A investigação é um quebra cabeça que você tem que ir montando”, explica Roberto Peterka.
Fonte: Fantástico