Um ex-cliente da empresa de consultoria que o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, manteve até assumir o cargo controla uma companhia que tem negócios milionários com o governo federal.
Gerida pelo fundo de investimentos americano KKR, a Aceco recebeu R$ 635 milhões de órgãos federais de 2007 a 2017, em valores não atualizados, por serviços de armazenagem de dados e salas-cofre de computadores.
A Aceco presta serviços para o Exército, agências reguladoras e hospitais, além de órgãos do Legislativo. Foi o primeiro e até agora é o único investimento feito no Brasil pelo KKR, que tem ativos avaliados em US$ 39 bilhões.
Há duas semanas, o site BuzzFeed revelou que Meirelles recebeu R$ 217 milhões como lucros de sua consultoria, a HM&A, por serviços prestados nos quatro anos anteriores à sua chegada ao governo.
Além do KKR, foram clientes da HM&A, segundo o ministro, o grupo financeiro Lazard e a J&F, empresa que controla a JBS e outros negócios dos irmãos Joesley e Wesley Batista, que dizem ter pago propina a aliados do presidente Michel Temer e políticos em troca de favores no governo.
O KKR contratou Meirelles como consultor dois anos antes da aquisição da Aceco, que foi concluída em 2014. As partes não revelam o valor do contrato com a consultoria.
Em 2012, ao anunciar a contratação de Meirelles como “conselheiro sênior”, os fundadores do KKR Henry Kravis e George Roberts o apontaram como “um parceiro tremendamente valioso para a empresa e o portfolio de nossa companhia ao redor do globo”.
Um executivo do fundo, Alex Navab, disse que o KKR confiava nos “conselhos e percepções de Meirelles no mundo da governança, finanças e investimentos conforme expandimos nossos negócios no Brasil e na América Latina”.
De janeiro de 2007 a dezembro de 2012, a Aceco recebeu R$ 173,5 milhões em contratos com órgãos da administração direta federal, conforme levantamento feito pela Folha.
Em 2013, foram R$ 174 milhões, mais do que tudo que havia recebido anteriormente. No ano seguinte, 2014, quando o KKR adquiriu o controle da Aceco, a empresa recebeu R$ 104 milhões. A empresa faturou com o governo mais R$ 90 milhões em 2015 e R$ 74 milhões em 2016.
A Folha não obteve informação de que Meirelles tenha participado de negociações sobre esses contratos. Em nota, o ministro negou ter participado de atividades operacionais do KKR e da Aceco.
Como a Folha mostrou no ano passado, o investimento virou objeto de controvérsia por causa de uma disputa entre o KKR e os antigos controladores. Os americanos acusaram os sócios de corrupção e fraudes contábeis. No ano passado, o empresário Jorge Nitzan, que nega ter praticado irregularidades, vendeu sua parte na Aceco para uma empresa especializada na gestão de ativos problemáticos.
Os americanos querem sair da Aceco, mas não querem se desfazer do negócio sem recuperar pelo menos parte dos prejuízos que sofreram. O fundo investiu R$ 1,2 bilhão na aquisição da empresa.
Em nota, a assessoria de Meirelles no Ministério da Fazenda afirmou que o ministro “não foi executivo da empresa [Aceco] e, portanto, não participou de nenhuma atividade operacional”. Segundo o ministério, a HM&A tinha contrato para “organizar a implantação do KKR no Brasil, com análise do mercado local, evolução do mercado de private equity no país e plano estratégico”. O ministro não esclareceu quanto recebeu do fundo, alegando sigilo fiscal.
Bocão News