O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) prossegue nesta quarta-feira (24) com a definição da pena de prisão para Marcos Valério, apontado como operador do esquema de compra de votos no Congresso Nacional para beneficiar o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Na análise de seis acusações diferentes, a pena pode chegar a 26 anos, 7 meses e 6 dias de prisão. Além disso, a multa chega a R$ 1,762 milhão (em valores que ainda serão corrigidos).
A pena pode ser reduzida porque os ministros ainda vão definir se houve concurso material (quando as penas são somadas), concurso formal (quando com uma só ação se pratica mais de um crime é aplicada a pena mais grave podendo ser ampliada) ou crime continuado (quando o segundo ou demais crimes são continuação do primeiro, então é aplicada a pena mais grave podendo ser ampliada) – clique para saber mais sobre as diferenças.
Segundo o Código Penal, condenados a penas acima de oito anos devem cumprir pena em regime fechado, o que deve ocorrer com Valério. Até a última atualização desta reportagem, o Supremo decidiu punições para os seguintes crimes:
Formação de quadrilha: 2 anos e 11 meses de reclusão.
Corrupção ativa relativa a contratos com a Câmara dos Deputados: 4 anos e 1 mês de reclusão, além de multa de R$ 432 mil, o equivalente a 180 dias-multa no valor de 10 salários mínimos cada (da época do cometimento do crime, de R$ 240).
Peculato relativo a contratos com a Câmara dos Deputados: 4 anos e 8 meses de reclusão, além de multa de R$ 546 mil, o equivalente a 210 dias-multa no valor de 10 salários mínimos cada (da época do cometimento do crime, de R$ 260).
Corrupção ativa relativa a contratos com o Banco do Brasil: 3 anos, 1 mês e 10 dias de reclusão, além de 30 dias-multa, cada dia valendo 15 salários mínimos da época do cometimento do crime. (se considerado o valor de R$ 240, chegaria a R$ 108 mil).
Peculato relativo a contratos com o Banco do Brasil (desvio do bônus de volume + Fundo Visanet): 5 anos, 7 meses e 6 dias de reclusão, além de multa de R$ 598 mil, o equivalente a 230 dias-multa no valor de 10 salários mínimos cada (da época do cometimento do crime, de R$ 260).
Lavagem de dinheiro: 6 anos, 2 meses e 20 dias de reclusão, além de multa de R$ 78 mil, o equivalente a 20 dias-multa no valor de 15 salários mínimos cada (da época do cometimento do crime, de R$ 260).
Corrupção ativa relativa a pagamento de propina a parlamentares: pena ainda não definida
Evasão de divisas: pena ainda não definida
O valor do dia-multa é apenas uma estimativa com base nas informações apresentadas pelos ministros, uma vez que o valor exato será definido, após correção monetária, pelo juiz de execução penal do local onde os réus forem presos.
Na discussão sobre a pena de lavagem de dinheiro, houve empate entre o voto do relator Joaquim Barbosa (que sugeriu 11 anos) e o do revisor Ricardo Lewandowski. Após discussão sobre a metodologia a adotar em caso de empate na dosimetria, a corte decidiu que prevalece o cálculo mais benéfico ao réu. Pelo voto de Lewandowski, deverá ocorrer ainda a “perda dos valores objetos do crime de lavagem de dinheiro.”
Ao aplicar pena a Marcos Valério, o presidente do Supremo, Carlos Ayres Britto, disse que o réu tem “apurado instinto de prospecção de dinheiro”. “Marcos Valério desempenhou papel de vanguarda, de comando, transitou com desenvoltura pelos descaminhos do Visanet, da Câmara dos Deputados, no Banco Rural, no uso de um apurado instinto de prospecção de dinheiro”, disse.
Multa e média das penas
De acordo com o Código Penal, dia-multa quer dizer que deve ser pago um valor determinado a cada dia de multa. A quantia é recolhida ao Fundo Penitenciário Nacional e deve ser de, no máximo, 360 dias-multa.
O valor do dia-multa não pode exceder cinco salários mínimos, podendo ser ampliada em até o triplo, ou 15 salários a depender da situação econômica do réu. A multa deve ser paga, diz a legislação, em até 10 dias depois do trânsito em julgado da ação, ou seja, quando não há mais possibilidade de recurso. Também há previsão de parcelamento do pagamento.
O ministro Cezar Peluso, que se aposentou no fim de agosto, já havia antecipado a pena para Marcos Valério, em razão de desvios na Câmara e no Banco do Brasil. A pena dada por Peluso foi de 16 anos. O presidente do Supremo, ministro Carlos Ayres Britto, informou que o voto de Peluso foi vencido.
Embora relator e o ministro Peluso tenham indicado a soma das penas de tipos penais diferentes, o ministro Celso de Mello, com mais tempo de corte, afirmou que em tese as penas podem não ser somadas ao final.
Segundo explicou, após a definição das punições os ministros irão realizar uma nova fase de verificação do “nexo de continuidade relativa”, que poderá reduzir as penas dos réus condenados. Ou seja, para Celso de Mello, é possível analisar a origem das condutas e juntar alguns crimes, mesmo que diferentes no tipo.
Divergência entre relator e revisor
Ao discutir a punição a Valério pelo crime de corrupção ativa em razão de desvios no Banco do Brasil, o revisor pediu que fosse aplicada lei anterior à atual, que previa pena de 1 a 8 anos para corrupção ativa. A punição foi aumentada por lei que alterou o Código Penal em novembro de 2003 para 2 a 12 anos.
Nesta quarta, o relator voltou a afirmar que o dinheiro foi recebido no dia 15 de janeiro de 2004 e, portanto, o cometimento do crime foi depois da mudança da lei. “Quanto a essa polêmica relativa à data da consumação do delito saliento que a vantagem indevida foi paga no dia 15 de janeiro de 2004. Portanto a conduta ao tempo efetivamente praticada ocorreu sob a égide da lei [que aumentou a pena]. Nenhum dado dos autos permite afirmar que o oferecimento ou promessa da vantagem indevida ocorreu ainda no ano de 2003”, ressaltou.
Lewandowski, então, argumentou que o crime de corrupção se consumou no momento da oferta de vantagem indevida por Marcos Valério, o que, de acordo com a denúncia teria ocorrido em 2003, sob a vigência da lei que previa pena menor para o delito. Ele disse que, na dúvida, deve ser considerado o que é mais benéfico ao reu.
O ministro Luiz Fux sugeriu que Barbosa mantivesse a pena mais elevada, com outra fundamentação que não a pena base da lei posterior. Lewandowski, em seguida, afirmou que o réu tem o direito de saber os detalhes que motivaram o juiz a calcular a pena. “O réu tem o direito de saber como se deu a dosimetria. Não estamos mais no tempo do Absolutismo”, disse.
O relator disse, então, que diante da “insistência” dos demais ministros, mantém a pena de 4 anos e 8 meses de prisão, considerando a punição prevista na lei anterior, que estabelece pena base de 1 ano e máxima de 8 anos. O voto do relator foi vencido por maioria dos ministros.
Ao início da sessão o advogado Marcelo Leonardo, que representa Marcos Valério, apresentou três questionamentos aos ministros do Supremo. A primeira foi para pedir que agravante a quem dirige ou lidera a atividade criminosa só seja usado para aumentar a pena do réu na condenação por formação de quadrilha.
A segunda questão de ordem foi para solicitar que as penas por tipos penais iguais a que o réu foi condenado não sejam somadas. “O acusado está condenado por cinco tipos penais diferentes. Não tem sentido imposição de pena mais de uma vez pelo mesmo tipo. Deve haver uma imputação por lavagem, uma por quadrilha, uma por corrupção ativa, uma por peculato e uma por evasão”, sustentou. Marcos Valério responde a três peculatos por episódios diferentes.
Marcelo Leonardo pediu ainda que não haja fixação de indenização civil ao réu, como forma de ressarcimento ao erário público dos valores desviados, como propos o ministro Celso de Mello.
Para o advogado, o pedido de indenização deveria ter sido feito na denúncia do Ministério Público, o que não ocorreu. Ele argumentou ainda que, se houver fixação de indenização, ela deve onerar os réus condenados por corrupção passiva, os que receberam dinheiro. “Quanto aos acusados beneficiários de repasses, que ficaram com os valores, a eventual obrigação de indenizar deve ser dirigida a eles”, disse.
Condenações e absolvições
Depois das penas, o Supremo também deve decidir se vai determinar a perda do cargo dos três deputados federais condenados: Valdemar, João Paulo Cunha (PT-SP) e Pedro Henry (PP-MT).
Veja abaixo a relação de todos os condenados e absolvidos:
RÉUS CONDENADOS
– Bispo Rodrigues (lavagem de dinheiro e corrupção passiva)
– Breno Fishberg (lavagem de dinheiro)
– Cristiano Paz (corrupção ativa, peculato, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha)
– Delúbio Soares (corrupção ativa e formação de quadrilha)
– Emerson Palmieri (lavagem de dinheiro e corrupção passiva)
– Enivaldo Quadrado (formação de quadrilha e lavagem de dinheiro)
– Henrique Pizzolatto (corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro)
– Jacinto Lamas (lavagem de dinheiro e corrupção passiva)
– João Cláudio Genu (formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e corrupção passiva)
– João Paulo Cunha (corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro)
– José Borba (corrupção passiva)
– José Dirceu(corrupção ativa e formação de quadrilha)
– José Genoino (corrupção ativa e formação de quadrilha)
– José Roberto Salgado (gestão fraudulenta, lavagem de dinheiro, evasão de divisas, formação de quadrilha)
– Kátia Rabello (gestão fraudulenta, lavagem de dinheiro, evasão de divisas, formação de quadrilha)
– Marcos Valério (Corrupção ativa, peculato, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e formação de quadrilha)
– Pedro Corrêa (formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e corrupção passiva)
– Pedro Henry (lavagem de dinheiro e corrupção passiva)
– Ramon Hollerbach (corrupção ativa, peculato, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e formação de quadrilha)
– Roberto Jefferson (lavagem de dinheiro e corrupção passiva)
– Rogério Tolentino (lavagem de dinheiro, corrupção ativa, formação de quadrilha)
– Romeu Queiroz (lavagem de dinheiro e corrupção passiva)
– Simone Vasconcelos (lavagem de dinheiro, corrupção ativa, evasão de divisas, formação de quadrilha)
– Valdemar Costa Neto (lavagem de dinheiro e corrupção passiva)
– Vinícius Samarane (gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro)
ABSOLVIÇÕES PARCIAIS (réus que foram condenados em outros crimes)
– Breno Fischberg (formação de quadrilha)
– Cristiano Paz (evasão de divisas)
– Jacinto Lamas (formação de quadrilha)
– João Paulo Cunha (peculato)
– José Borba (lavagem de dinheiro)
– Pedro Henry (formação de quadrilha)
– Valdemar Costa Neto (formação de quadrilha)
– Vinícius Samarane (formação de quadrilha e evasão de divisas)
RÉUS ABSOLVIDOS
– Anderson Adauto (corrupção ativa e lavagem de dinheiro)
– Anita Leocádia (lavagem de dinheiro)
– Antônio Lamas (lavagem de dinheiro e formação de quadrilha)
– Ayanna Tenório (gestão fraudulenta, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e formação de quadrilha)
– Duda Mendonça (lavagem de dinheiro e evasão de divisas)
– Geiza Dias (lavagem de dinheiro, evasão de divisas e formação de quadrilha)
– João Magno (lavagem de dinheiro)
– José Luiz Alves (lavagem de dinheiro)
– Luiz Gushiken (peculato)
– Paulo Rocha (lavagem de dinheiro)
– Professor Luizinho (lavagem de dinheiro)
– Zilmar Fernandes (lavagem de dinheiro e evasão de divisas)